Blog do escritor Ferréz

Eita Porra, o sarau vai explodir na quarta.

Salve,
é isso memo nêgo, na quarta o sarau vai pegar fogo, tô voltando agora da biblioteca da periferia ativa, que tá sendo pintada pra inauguração (calma eu aviso aqui quando for a data) e o comentário é um só.
show do Gog no Sarau da Cooperifa.
e tem mais, confirmaram presença (pelo menos pra mim) Marcelino Freire, Fernando Pessoa, Carlos Drummond de Andrade, Paulo Coelho, Robson Canto, Pezão e vem até gringo, to negociando com o Gorki e com o Bukowski e tá quase fechado.
Vai perder? vai ficar no BBB? azar o seu, eu vou tar lá, e uma pá de mano e mina de bom coração também, vamos fazer da perifa uma só voz, de indignação e de esperança, quem viver verá, quem não, rezará.
Ferréz

Salve Rapa
agora é sem volta.
A coletânia 1dasul já foi pra prensa, êta coisa difícil é fazer o disco, finalizar, ligar pra todo mundo, estúdio, letra, ave maria, quem já passou por isso sabe.
mas finalmente a criança vai nascer, é questão de 20 dias agora.
independente, sem porra de atrasa lado nenhum, porque já finalizei vários trampos, mas na hora agente entrega pro zotro, então fica tudo assim, agente num recebe, (tem distribuidora me devendo uma quantia tão irrisória que dá vergonha) mas é assim mesmo, agora num tem desculpa é tudo nosso.
vamos ver, só tem que tomar cuidado, porque se der certo....ah! ai eles nunca mais vai ver nada nosso, temos que tomar o rumo da nossa história.

em breve, mais um capítulo dessa luta estará em nosso dia a dia.
Ferréz
Tenho acompanhado os textos de Ferréz diariamente em seu blog, e a cada um que leio sei que aumenta mas a responsabilidade de quem escreve, e aumenta a auto-estima de quem lê.
Se já não bastasse tudo isso, também é impossível degustar suas palavras, sem que a alma saia ferida ou incomodada.
Suas lâminas são mais afiadas do que parecem.
Não recomendo sua literatura aos desavisados, os cortes são profundos.
Ao lê-lo, sempre, lembro do fime "Edward mãos de tesoura, é isso.
O resto é perfumaria, o resto é miudeza de armarinho.
firme na luta e no respeito,
Sérgio Vaz

Faleceu um dos melhores

Até mais Leo Gilson Ribeiro, a literatura fica mais pobre com certeza.
Faleceu na tarde do dia 11 de janeiro, aos 77 anos, o jornalista e crítico literário e teatral Leo Gilson Ribeiro, editor da seção Janelas Abertas de Caros Amigos. Tendo sido alto executivo da Olivetti, Leo Gilson, nos anos 1960 optou por ser crítico literário na imprensa, tendo passado pelo Jornal da Tarde, muito influente na época, e pelas revistas Realidade e Veja. Era doutor em literatura pelas universidades de Hamburgo e Heidelberg e amigo pessoal do escritor Guimarães Rosa e da poeta Hilda Hilst; com toda essa bagagem, tornou-se um dos críticos literários mais influentes e mais respeitados do país. Foi premiado com o Jabuti em 1968 e com o Esso (de reportagem) em 1969.

Durante toda a sua vida Leo Gilson foi um batalhador pela cultura das letras no Brasil. Atacava ferinamente as traduções malfeitas, as edições improvisadas – procurava impor o respeito ao leitor. Combateu incansavelmente a incultura nacional, procurando difundir a boa literatura por todos os meios a seu alcance. Profundo conhecedor da literatura universal, não se conformava com o fato de os brasileiros não terem maior consideração pela sua própria leitura; achava, por exemplo, perfeitamente cabível que o poeta Carlos Drummond de Andrade fosse considerado como sendo de estatura mundial e merecedor do Nobel. Além dos muitos ensaios publicados, escreveu livros de crítica literária entre os quais se destacam “Cronistas do Absurdo” (ed. José Álvaro, 1964) e “O Continente Submerso” (Editora Best-Seller,1988). No teatro escreveu a peça “Balada de Manhattan” que recebeu o Prêmio Governador do Estado em 1971 e traduziu textos de Tennessee Williams e Steven Berkoff.

Politicamente, Leo Gilson era acima de tudo um defensor da liberdade, e se opôs, por exemplo, ao regime soviético, por sua censura aos escritores, e, ao regime cubano, além disso, pela homofobia de seus dirigentes principais. Mas também compartilhava dos sofrimentos da grande maioria da população brasileira e mundial, e, levado por sua conversão ao budismo, lutava também incansavelmente pela melhoria das condições de vida dos povos, pela paz e pela solidariedade internacional.
a Caros Amigos perde um grande jornalista e os amigos perdem um grande amigo, até mais parceiro.
Ferréz


O sepultamento se dará amanhã, dia 12, após velório, no Mausoléu dos Jornalistas, no Cemitério São Paulo, em horário ainda a ser estabelecido. As informações sobre os horários, do velório e do sepultamento, serão dadas pelos telefones (11) 3819 0130 (Revista Caros Amigos) e (11) 3032 5986 (Cemitério São Paulo).

Vida em manutenção (texto inédito)

Vida em manutenção.

Um dia desses fui junto com um amigo no bom prato, projeto tão lembrado durante a campanha política. Cada um faz seu paternalismo de um jeito.
Lá a realidade é só uma, saquinho de farinha no bolso pra misturar com a comida, gente que chega as 10 da manhã com medo de perder a fila. Um senhor logo começa a falar comigo. – Fio, porque eles num faz janta também? Porque eles num dá um café da manhã?
Eu balanço a cabeça e finjo não saber a resposta enquanto não tiro os olhos daquele senhor, que na pele mostra o tanto que já sofreu.
E não é só isso, e o que será que eles comem no sábado e domingo? Então antes de sair eu pergunto, ele reponde com uma palavra. - Pão.
Por um momento penso que a sobremesa do bom prato bem que podia ser um livro.
Paro a viagem, vou pegar a real sobremesa, uma mexerica, que estava com uma casca difícil de tirar, fui saindo de boa e trombei outro amigo e logo perguntei.
- mas você num ta trabalhando?
- to sim, naquela loja ali na frente.
- e porque come aqui?
- você sabe né, economizar os tickets pra mistura e pra feira.
- e você?
- bom, eu sou escritor, num preciso falar mais nada né?
Dou um abraço no amigo e saio pensando na cena que vi ontem, os camelôs apanhando no centro da cidade, sempre a mesma coisa, vai chegando fim de ano o bicho pega, lembro do chefe das subprefeituras falando que aquilo não era vendedor ambulante, que eles só vendem coisas contrabandeadas, boa conversa, discurso de quem nunca passou uma dificuldade é sempre comovente.
Ele é daqueles que nunca pagou pra tirar a carta de motorista, nunca tenha dado um qualquer pra um policial evitar a multa, nunca prejudicou alguém no escritório, nunca falou mal de alguém e fez uma conversa virar problema, nunca tenha ficado calado quando soube de um esquema maior. Não ele não. Ele é o onipresente nesse momento, o senhor da verdade absoluta, assim como vários homens entupidos de retórica.
A vida aqui fora é outra, se você não a vive, não sabe do que se trata.
Dizem que sou revoltado, quando falo em algumas questões ficam abalados, mas tantos olham e não enxergam.
Senhor, formigueiro humano, compra de natal, eles usam seu nome em vão, constroem templos gigantescos, massacram os mais humildes mentalmente com histórias distorcidas, quem for inocente jogue a primeira cruz na rua.
Tudo virou comércio, seu sonho não é mais ser, é ter, iates, cavalos, gados com chips enquanto crianças perdidas não valem uma casa de abrigo. Sinto muito, mas a modelo sem calcinha é a notícia da semana.
Genival veio me dizer um dia, que não tem espaço para coisas positivas na mídia, eu aprendi com você Genival, vende tanta Caras, vende tanta Tititi, vende tanto porque eles são os ricos que meu povo adora.
O tema se tornou recorrente, favela, violência, seqüestro, roubo.
Mas na propaganda do disque denúncia é só seqüestro, crime contra pobre num conta, num adianta denunciar, agente quer é seqüestrador.
Eu sei que todos falam da guerra, mas se isso é uma guerra, porque não vejo vencedores nem ontem nem agora?
Consumismo desenfreado, pra não ficar chateado toma o meu cartão, compra algo.
Qual o tamanho do seu sonho? Ele tem 2 ou 4 rodas, tem estilo? Ou você tem ou não tem. Ele é azul, metálico? Ele é slim? talvez seja digital, prata? Veloz? Talvez seja leve, fácil de transportar e de teclar, pode ser de esquentar, também pode ser que ele frite coisas, ou só as cozinhe, mantendo assim as proteínas. Talvez você leve ele no pulso.
Talvez você coma ele. Seu sonho dá para enrabar? Talvez você monte nele, seu sonho seria um par de olhos? Belos e fixos dentro da sua alma?
Más notícias pra você, felicidade não vem com nota fiscal.
O problema do Brasil minha pequena Lisístrata é esse. Que trabalho vão me dar? Onde vou me encaixar no mercado? Tem vaga mais pra ninguém não, ta difícil pra você ta difícil pra todo mundo, você tem que ser criativo se quiser comer.
Estou falando do que vejo, um monte de gente que nem você indo pro mesmo caminho, fila pra emprego, trafico, roubo de gravata ou sem, é tudo a mesma coisa, só diminui ou aumenta o grau de humilhação, no final uma coisa sustenta a outra, ou do que viveriam tantos advogados, promotores, delegados, juízes?
Falam em matar, falam em palavras que não fazem curva, mas só atiram em iguais a vocês, somente um motivo, banal, qualquer coisa e bum! Acabam com uma vida, mas nos muros de todo o morro, nomes de políticos, uma esmola sequer, e lá estão vocês envolvidos, não vêem que eles são os reais inimigos? Com seus ternos caros, suas caras de porcos, suas mentes mais sujas que os córregos que nos cercam? Eles são os inimigos, são os mentores por traz de toda essa miséria, toda essa violência, e pior meu filho, quem elege eles é você, é como se alguém te desse a incrível oportunidade de você mesmo se prejudicar.
Vamos fazer um acordo? parar de matar a esperança, distribuir o falso troféu de uma vida curta, alimentando essa cadeia de parasitas, que só vêem agente traficando, que só vêem agente se prostituindo, quando na verdade não tem mais gente honesta do que aqui.
honesta sim, todos como meu amigo Paulo, trabalhador que sonha com seu carro ano após ano, tem muitos. Venha na favela de madrugada e veja quantos ônibus saem lotados pela manhã? Ou vocês vão me falar que é tudo ladrão, ladrão meu querido não enche ônibus.
Mas criminalizar o gueto é necessário, ah! Isso não pode parar, se não o povo vai se revoltar com o que heim? Temos que linchar o pé de chinelo, para o colarinho branco se candidatar de novo.
Temos que começar de novo, reformular tudo, se fala tanto do tráfico, e os barbitúricos, e os tarjas pretas?
Agente só vê o que quer meus amigos, mas ninguém aqui está com a razão, ela já fugiu desse país a muito tempo.
Uma coisa não legitima a outra, mas opressão demais num cheira bem. Num sei muita coisa não, mas tenho certeza que se tem que escorrer tanto sangue por isso, se vamos morrer, que seja por rasgar a constituição, afinal ela só serve pra quem tem dinheiro.
A nossa vida não tem que ser uma filial do Afeganistão, se tiver que ter uma guerra que seja contra quem oprime e não contra outros oprimidos.
Um dia agente vai entender porque não tem ensino, porque é mais barato sermos treinados segurando uma pistola e matando outro periférico.
Caixinhas, todos somos separados em caixinhas, mas a pergunta é. Quem embala tudo isso?
Mudar daqui é mó mamão, mudar a favela é difícil, mas agente tem que tentar, tem que continuar nossa pequena parte nisso tudo, eu fiquei aqui, minha filha vai nascer aqui, eu quero que esse seja o melhor lugar do mundo pra ela e pra todos os que vão continuar aqui, quem é não comenta, essa é a pegada, eu continuo acreditando que a revolução será silenciosa e determinada como ler um livro a luz de velas em plena madrugada.


Ferréz (direto do campo de extermínio)


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Pegou um Axé (Ferréz)

Pegou um axé. (Do livro Ninguém é inocente em São Paulo, Editora Objetiva)

Cheguei cedo naquele encontro.
Minhas mãos estavam suadas.
O nervosismo sempre me acompanhou, desde a época do colégio.
Quem diria que fosse terminar a faculdade tão cedo?
E ninguém acreditava que aquele garoto acanhado fosse entrar no maior jornal do país.
Também as coisas não foram tão trabalhosas.
Uns telefonemas do meu pai e pronto.
Mas saiba que eu estudei pra caralho, viu?
Trabalhou a vida inteira no meio, então nada mais justo que indicar o filhão.
Profissão filho, o caralho, eu ralei, mané.
Eu ralei pra caramba mesmo, uma vez até tive que lavar banheiro num acampamento.
Foi um dia que a empregada se injuriou com a bebedeira da gente.
Bom, só sei que estou quase indo.
Vai ser a maior aventura da minha vida.
Por isso fumei um baseado antes.
Mereço um pouquinho de emoção.
Todo dia ficar naquela redação dá nos nervos.
Tudo isso para pagar a casa na praia.
Pra ser sincero, se tivesse um maconha e uma farinha de vez em quando tava bom.
Mas fui arrumar mulher, e aí já viu, elas sempre querem alguma coisa.
O gasto com cabelo é fichinha perto da nova decoração que ela quer na casa.
As amigas fazem o mesmo com os maridos.
Meu tio me dizia que putas são mais honestas, já cobram logo adiantado.
Isso forma uma rede, onde elas querem, nós damos e ninguém é feliz.
Todas as amantes estão esperando o casamento dos seus pretendentes chegarem ao fim.
Conheci uma mina na facu que ficava molhadinha quando via homem casado.
Devia ter um museu para os vários tipos de mulher nesse mundo.
Bom, acho que é ele.
Preto com roupa larga, só pode ser.
E aí, tudo bem?
Tudo bem, rapaz, demorou um pouco.
É que o relógio da rua é de outro ritmo, tá ligado?
Sei.
Odiava aquele tipo de conversa, mas por uma matéria a gente até conversa com eles.
Começamos a andar, eram tantas gírias que eu estava prestando atenção somente nos finais das frases.
Acho que eles são todos iguais.
No final, se essa reportagem vai ficar muito boa, posso até continuar e desenvolver uma pesquisa.
De repente fazer um livro, afinal esse assunto está na moda. E melhor ainda, aprovar na lei de incentivo e já sair com o livro pago, isso é que é malandragem.
Figura estranha, não pára de falar, também são 500 anos de pobreza.
Falta de dinheiro deve gerar uma deprê neles do caralho.
Por isso eles usam também tanta droga.
Vai ver o pai deles não trabalhou que nem o meu.
Fiquei sabendo que eles ficam só bebendo e jogando bola.
A visão vai ficando pior, quanto mais a gente anda, mais barraco vai aparecendo.
Começo a me arrepender de ter insistido na idéia.
E se isso virar um pesadelo, o que vou fazer?
As ruas são inacreditáveis, buraco por todos os lados.
Bom, qualquer coisa eu digo que ajudo uma ONG.
Isso, posso até pensar em fazer uma ONG, isso dá dinheiro demais.
Posso até dizer que tenho um policial na família.
Não, melhor não, sei que eles têm ódio de polícia.
Esse rapaz não deve ser mau, afinal foi minha tinha que indicou.
Ela tem uma empregada que é vizinha dele.
E no final esse pessoal do hip hop acha que pode mudar as coisas.
Não podem nem pagar a pensão pros filhos e querem mudar alguma coisa.
E esse negócio de sistema, de jogo.
Um dia eles acordam e notam que a coisa é assim mesmo.
Pra uns terem muito, a maioria tem que se fuder sem nada.
Bom, parece que finalmente chegamos.
Bar do Zezinho é o que ele disse.
Começou a me apresentar para a rapaziada.
Firme e forte.
Tô legal e vocês?
Então, o doutor é jornalista.
Sou, sim, mas sou do bem.
Do bem era aquele tal de Tim Lopes, há, há, há.
A risada ficou generalizada, não conseguia achar graça mas comecei a rir.
Sei lá o que passava na cabeça daquela gente, estava quase todo mundo chapado.
Se eu escapasse dessa talvez nunca mais iria para um buraco daquele.
O neguinho que era meu contato pediu para que eu entrasse.
Fomos caminhando para o balcão do bar.
Lá, ele me serviu um refrigerante.
Disse que os outros caras do grupo logo estariam lá.
Fiquei mais aliviado, pelo menos não demoraria mais.
Se eles não tivessem chegado logo eu teria saído fora.
Bandas de rock são tão legais de entrevistar.
E eu pagando mó veneno ali, naquele boteco fedido.
De repente chegaram mais três neguinhos.
Eles falaram os nomes, e seguraram firme na minha mão.
Comecei a entrevista.
As primeiras perguntas foram sobre a profissionalização do rap.
Mas eu queria logo é partir para a violência.
Eles deveriam ter dezenas de histórias desgraçadas.
Eu já tinha as perguntas na ponta da língua.
O que os policiais tanto procuram aqui?
Por que eles agridem vocês?
Eles discriminam vocês pela cor?
Quem comanda o tráfico?
Mas para isso eu tinha que ir devagar.
A Edilene disse que eles são bem sistemáticos.
E eu sabia que ia conseguir que eles abrissem a boca.
Eram meio ingênuos.
E por traz daquela marra toda, só tinha quatro meninos com um sonho.
Ser um grupo de rap famoso.
Foi quando vi aquele menino com um facão nas mãos subindo a escada para o andar de cima do bar.
Pensei em perguntar, mas quando ele já estava no ultimo degrau, disse.
Desse não sobra nada.
Comecei a tremer, mas tentei disfarçar, fiz logo várias perguntas sobre o tal do hip hop e eles foram respondendo.
Confesso que não entendia nada, só via as bocas se mexendo.
Não conseguia parar de pensar.
Era assim que eles eram.
Com certeza havia um cara seqüestrado lá em cima e aquele menino talvez fosse machucá-lo.
O que eu poderia fazer?
Tentei lembrar das propagandas do Disque-Denúncia, o número era muito comprido, não vinha inteiro na minha mente.
E se eu pegasse o meu celular, talvez até me roubassem.
Mas não me deixariam vivo, roubo seguido de morte.
Foi quando um homem se aproximou com uma serrinha de cortar cano e também subiu.
Meu Deus, coitado daquele homem, talvez fosse até um ex-amigo de faculdade.
Talvez o pai da Caru, minha esposa.
Afinal o pai dela era banqueiro.
Os negrinhos continuavam a responder às perguntas, divagando sobre a cultura da periferia.
Eu estava suando frio e quase desmaiei quando vi o homem que havia subido com a serrinha descer já todo sujo de sangue.
Tentei lembrar de algum trecho da música do Racionais que me servisse para argumentar a favor da minha vida, mas tudo sumiu da minha mente.
Eu só escutava essas músicas quando tava na balada.
Por um momento minhas vistas escureceram.
Eu fiz um grande esforço para não desmaiar.
Lembrei do meu cachorro Frank.
Dos meus peixinhos Josef e Ernesto.
Lembrei dos filmes do Woody Allen.
Eu só queria comer uma Pizza-Hut novamente.
Talvez mais uma ida ao Caribe.
O homem que havia subido com a serrinha desceu todo sujo de sangue.
Agora no fundo da minha alma eu sabia que não sairia dali com vida.
Eu ficava ouvindo Korn o dia inteiro e agora não sabia uma frase de rap para salvar minha vida.
Uma vez vi um neguinho na TV, ele era do rap também, mas não lembro o nome dele.
Os meninos do hip hop agora estavam parados à minha frente.
Certamente não entendiam o que estava acontecendo comigo.
Eu sei que estava quase entrando em choque.
Tinha que me acalmar.
Lá de cima vinha muito barulho, vozes misturadas.
Meu Deus, o que estariam fazendo com aquele homem?
Pedi para que cada um falasse um pouquinho da sua vida.
Eles começaram a contar dos primeiros empregos.
Imaginei o homem amarrado, implorando pela vida.
Não lembrava do neguinho que vi na TV, eu não tinha nome nenhum para falar, para me valorizar.
Os neguinhos agora falavam das dificuldades com a família.
Principalmente com o pai que sempre bebia.
Eu não conseguia me concentrar.
Talvez tivessem abrindo ele como se abre um porco.
Uma senhora se aproximou da escada e gritou.
O rim é meu, o Bahia me deve.
Foi nessa hora que minhas pernas fraquejaram.
Sempre pensei que todos merecem uma chance.
Eles mereciam, eu também, aquele homem também.
Porra, justiça social do caralho, tão esquartejando o homem.
Os meninos me seguraram antes de eu cair por completo no chão.
Me arrastaram pra uma cadeira.
Eu pensando nos rins do pobre do Bahia.
O que será que esse tal de Bahia havia feito?
Talvez estupro.
Os meninos do hip hop tentavam me dar água.
Talvez tivesse roubado algum morador, ouvi dizer que eles não perdoam isso.
Eu só conseguia imaginar os rins do homem nas mãos da velha.
Fizeram eu beber um pouco.
Percebi que a água estava com açúcar.
O homem que havia subido com a serrinha e que estava sujo de sangue se aproximou.
Eu fingi não vê-lo, ele perguntou se precisava de ajuda.
Tentei pronunciar alguma palavra, mas nada saía.
Meu pequeno cachorro Frank, como ele gostava de dormir comigo.
Minha querida esposa reclamava, mas eu insistia em dormir com ele.
O último livro que estava lendo.
A prestação do carro novo dela.
Tantas coisas, talvez um filho.
Mas fariam isso comigo antes.
Os malditos iam me picar também.
Me sentia como no filme "O Massacre da Serra Elétrica".
Povo desumano.
Talvez seja por isso que eles viviam sofrendo.
Esses tipos de coisas eles traziam da África.
Lá era legalizada essa porra toda.
Meu pai dizia que eles eram amaldiçoados.
Meus amigos nunca mais me veriam.
Comecei a notar os rostos do meninos do rap de novo.
Estava voltando a mim.
Metade do pessoal do bar começou a subir as escadas, todos passavam por mim apressados.
Seria agora, era a hora que eu imaginava.
Aquela porra de lugar era como nos países onde a pena de morte é legalizada.
Todos queriam ver o homem morrer como se fosse um show.
Eu lembro de ter parado no terceiro Pai-Nosso.
Eu tinha tantos planos, talvez o meu próprio jornal.
Tanto estudo, tantos cursos, para acabar nesse buraco.
Começaram a descer, eu desmaiei de novo quando vi todo aquele sangue nas mãos deles.
Duas horas depois acordei.
Havia uma balança no balcão do bar.
Uma faca cortava a todo momento uma grande peça de carne.
Pessoas saíam da fila com sacos cheios.
Os meninos do hip hop haviam desistido da entrevista, estavam todos ao meu lado.
Era um coisa que a comunidade sempre fazia, me explicaram.
Comprar um boi e dividir as partes.


(Esse conto e mais 17 estão no Livro: Ninguém é inocente em São Paulo, editora Objetiva).

Purque só pruz bacana fí? (texto Inédito)

Purque só pruz bacana fi?

Hoji sou ladrão, artigo um cinco sete...
Carái, de novo essa porra?
Hoji sou ladrão, artigo um cinco sete...
Porra fi, só sabe cantar essa.
Eu sei outra.
Quem ta te chamando na conversa?
Deixa.
Cóu qui é?
U homi na estrada recomeça sua vida...
Carái, essa é muito véia.
Qui nada, então lança uma ai?
Num sô canto.
Mas lança ai fi!
Carái, para cum essa porra de fi.
E você, só com o Caralho na boca?
É mesmo Hugo, só vive lançando Carái.
Ta bom, ta bom, vamu faze o que hoje?
Sei lá, vamu no novo shopi.
Faze o que? Apanha do segurança di novo?
Fi, ele bate em nóis mais não.
Bate não? E os cascudo que tu levou neguim?
Foi de vacilação do Hugo, que caiu pela rampa.
Também, rampa de alejado do caralho.
Mas e ai, vamo faze o que?
Num sei, olhar carro de novo?
Ta foda Marcinho, nóis ta ficando grande já.
Grande? Tenho 8 ano porra, e você?
Eu tenho 9 igual ao Hugo.
É memo fi, já fumei até baseado.
Grande merda, baseado de bosta de vaca.
Ai fi! tira biqueira do cara não, lá eles vende um dá hora.
Quem dá hora é relógio, neguim.
Para de me chamar de neguim.
Porque?
Tipo ta me tirando.
Acho que cê ta ouvindo muito rap, ta até pensando qui é gente.
Sô gente sim, e... se liga ai.
Carái, olha que pegada mostro.
É uma academia de musculação.
Vamu cola lá e vê?
Vamu.

Sim?
Agente queria só olhar, moça.
Bom...pode ir lá na frente e ver, ta vendo aquele vidro?
To sim moça.
Então, olha por ele, depois raspa fora daqui.

Ta bom moça.
Olha que loco.
Pode crê Hugo, que bagulho dá hora.
É piscina isso ai!
Pode crê, piscina com vários boy.
Num é boy não fi, aquele cara ali mesmo ele mora lá na favela.
Pode crê, o irmão dele joga uma bola no campinho.
É, se ele ta aqui é porque o bagulho num é de boy.
Isso num tem a ver, e se ele for boy?
É...pode ser.
Carái.
Bem loco né?
Calor desses, dá até vontade.
Pode crê, água geladinha.
Olha Hugo, até babou.
Sai pra lá filha da puta.
Ta nervoso? É o sol nu côco.
Ei! vocês? Por favor, já viram, agora pode sair.
Nossa moça, só tamu olhando.
É, mas já olharam muito, isso aqui num é Febem não, agora rua.
Rua é o caralho, corre rapa!
Ei! Volta aqui.
Que bom, porra muito louco, carái que gostoso, porra afunda de novo, puta que pariu, viva caralho, gostoso pra caralho, corre não tia, aqui ta pela ordi, joga água na cara do Hugo, olha isso, to nadando de cachorrinho, isso sim é chapado, pode crer que gostoso, para de falar e vamu ralar, ah! É? Então me pega agora, eu te pego fi, sei nadar de costa, isso ai é boiar, há há há.

Então Senhor policial me fala o que ta acontecendo.
Tudo bem, mas num bate no menino agora não, espera agente levar os outros dois pra casa deles, depois o senhor educa ele.
Tá, mas me fala o que aconteceu.
Bom, segundo o relato da Dona Cíntia, recepcionista da Academia American, esses menores tavam olhando a piscina pelo outro lado do vidro, ai de repente eles correram, passaram pela catraca e invadiram o recinto, ou seja pularam dentro da piscina.

Ferréz

Essa é pra você

Essa é pra você

Que pensou que ia passar batido, mas antes do fim de 2006 nóis tinha que trocar uma idéia.
O nosso o povo anda sem direito, de cabeça baixa, humilhado, jogado, os dominantes as ordens pique alienado, o rap era compromisso hoje é abrigo pra safado.
Uma boa parte do rap ta assim, separado em partidos, imitando o estado, correndo pela verba e a esmola do asfalto, e eu me pergunto cadê a revolução que vocês tanto pregava, depois que acreditei virei o fio da navalha.
Meu rap não tem partido, não tem sindicato, não tem catálogo.
Minha literatura marginal ainda não está cansada, somos preparados pra guerra sim, porque temos o ódio, o rancor e a visão.
Moeda entorta a palavra, hoje corre pelo seu enquanto os barraco desaba, pique zé gatão, cheio de querer ser, deixa nóis se tromba pro cê vê, isso num é ameaça, isso é promessa.
Aqui sem pagar de quebrada, só um mano com a adaga afiada, revoltado com tudo que muitos vêem, mas pouco se fala.
Revoltado pra caralho, também esse ano apesar de ter prometido, nessa parte eu falhei novamente, claro que me exploraram pouco perto do que foi em 2005, mas mesmo assim...repórteres mentirosos que só queriam saber do PCC puseram minha vida em risco, tudo bem, eu assumo o que falei, mas depois se fosse por eles eu já estaria num caixão barato.
Enquanto isso, sobre meu livro? Promessas vazias, - fala com agente sobre isso depois agente fala do livro – e nada, nada em nenhum lugar. fazer concessão com o inimigo dá nisso.
Num to reclamando no vazio, num to vendendo fumaça, a real é uma só, sobre isso agora só o silêncio, vão ter que ficar no escuro, pois a nossa São Paulo sempre foi essa, seja bem vindos. Mas de mim não vão saber mais nada.
Os parceiros que tão lendo sabem do que estou falando, estereotipar, carimbar, rotular, casar o nome da periferia com violência, é só isso que eles enxergam, é só isso que vêem, foi isso que ensinaram para eles.
Preconceito meu querido num é só coisa ruim, tem muita coisa que você pensa que é certo, muita opinião determinada que você tem que é recheada disso.
Que se foda o que acontecer depois, afinal eles vão voltar pras suas caixinhas nos jardins, cada um com seu cachorrinho e seu contra cheque no final do mês, para gastar mais com o cachorro no pet shop do que qualquer menino de rua mereceria.
Sivuca tinha espaço na mídia? No dia da sua morte teve espaço em todos os canais, em todos os horários, êta pais hipócrita, onde o artista não tem espaço pra falar de um novo disco, mas se ele tiver algum problema, então põe ele na mira.
Querem a lágrima doida do ídolo caído.
Deus não perdoe eles, eles sabem muito bem o que fazem.
Usado, fui muito usado mesmo, num vou negar, claro que disse muito não, to aprendendo a dizer mais, afinal lançamento de livro num é escritório, chega projeto, chega proposta, chega tudo, e eu só querendo autografar o livro, ir para casa e descansar um pouco.
Nem na Cooperifa posso ir mais, chegam em mim como um balcão de negócios, e lembro da música. “se é isso que cês qué vem pegar, jogar num rio de bosta e vê vários pular”. E eu que só quero ouvir a poesia do Pezão, do Ridson e da Rose.
Mas o texto que mandei, que ficou sem resposta, isso é foda, foda mesmo, quando você põe sonhos ali, também né? Tanta promessa, agente se ilude mesmo, porra! Um montão de gente vai ler meu texto, que legal. Mas no final, eles levaram o que queriam, uma opinião sobre tal situação, uma foto na favela, junto dos muros furados, dos barracos quase caindo, pra que se preocupar comigo? o rato de laboratório, To longe das festinhas, to longe de trombar com eles no cotidiano, e eu mastigo tudo isso como se come carquejo, já comeu? Não! Já tomou? Talvez com pinga? Eu servi isso 5 anos da minha vida em botecos.
Mas tem muita coisa dando certa, a biblioteca aqui na Sabim ta ficando linda, vai ter 2 andares, mais de três computadores, brinquedoteca e até um estúdio de som, estamos plantando através do projeto periferia ativa a 2 anos e agora em 2007 se inaugura nossa maior conquista. uma única regra, não aceitamos imprensa. já chega na festa que fizemos com tanto suor aqui na quebrada, devendo até pro capeta e quem sai no Estadão cercado de criança do lado? deixa quieto, depois que agente num aceita todo mundo reclama.
Também aumentamos a 1dasul, crescemos tanto em qualidade como em oportunidade, somamos parcerias e agora tem muito mais responsa nas costas do guerreiro aqui.
Tantas vitórias, tantos corres, tantos exemplos bons, a festa da grisson, a festa da Godoi, os manos da União de responsa, os pátios das escolas cheios para se assistir as palestras, é a cultura ferve na zona sul, zona show.
Quem escreve aqui hoje, ta desenvolvendo um sensor, to tentando ficar mais ligeiro, mas num vou mentir, ta foda.
Ainda bem que esse blog serve como desabafo, senão eu ficaria louco, como tantos aqui, que chapam feio, televisão que ilude, engana, onde o sbt é um bingo ambulante, a globo uma fábrica de traição com suas novelas, a record tendenciosa e moralista.
É nego, ta difícil, no rap ce num consegue ouvir mais nada de bom, caras que demoram 5 anos pra lançar um disco, caralho ce vai correr pra onde?
Eu to quase me sentindo melhor, apesar do James Brown ter ido pra outro lugar, de terem matado o Sadan quando na verdade era o Bush que devia estar no laço agora com sua presidência desastrosa e unilateral, assassina e mais culpada que qualquer ditador, é só estudar como ele se reelegeu, medo, puro medo, justamente o que os ditadores promovem, o mesmo medo. mas quando é com eles não tem esse nome.
tenho uma solução pros aumentos do deputados, cada um que aceitar o aumento, ganha de presente uma bala na cabeça, que tal?
Quando entrei foi por amor, por ideologia e por mudança, não para conviver com vermes que ainda tem a cara de pau de dizer que somos todos parecidos.
A verdade? Num sabe trabalhar, num sabe reivindicar, num sabe participar, tem preguiça até de acordar cedo, medo da vida e do trabalho.
Depois diz bem auto – Sou revolucionário.
Aqui tio, ninguém pilota, ninguém me manda dizer isso ou aquilo, num tenho vocação pra ser pau mandado, pra ser maquiado, pra andar na Daslu, que se foda, onde meu povo tem que andar com uniforme de empregado, onde ele é classificado, embalado, e o emposto não é pago, não me faz bem.
Minha periferia não é central, minha favela num é única, e eu não compactuo com safado.
Sem muitas delongas, o meu corre sempre foi reto, de um livro, pra uma revista, pra uma marca que levantei com meus punhos, e hoje consigo manter minha família, e sabe o mais lindo? Num me sujeitei, nunca trai o que eu acreditava, já fui enganado, isso sim, mas nunca trai o que eu sou.
Mas finalmente o corre tem sido recompensado, ainda continuo indignado, irado, revoltado, só que tenho estrutura para espalhar minhas palavras.
Antes de acabar o ano, eu tinha que falar, afinal eu tenho pra trocar.
Deram uma brecha pro maloqueiro aqui, e acredita se quiser, um texto virou um fanzine, que virou um livro, que virou um movimento.
Fui roubado muitas vezes, enganado por uma editora pilantra, que hoje nem fumaça vende, afinal cobra num tem asa.
Apesar que os amigos desse pilantra insistem em distribuir os livros, livros esses que os autores nem receberam seus direitos, eu mudei de casa, e na minha nova casa fui tratado como merecia, com respeito, e já são 3 livros com a Objetiva, e todos que podem agora comprar o livro em qualquer lugar desse pais também agradecem.
Por ajudar um ou outro parceiro no rap e na perifa, paguei o preço auto da ingratidão, mas se perguntar se faria de novo, a resposta seria sim.
Tem amizade que me custou R$ 100,00, tem amizade que me custou R$ 5,00 e foi barato o prejuízo, porque confiança é mais cara.
No fim, andando na minha quebrada, onde os braços dos pequenos se levantam pra me cumprimentar eu vejo que tenho o que vocês num vão ter, respeito, nada mais que respeito.
E isso nego, ninguém compra, ninguém negocia, ninguém exige, isso se conquista.
Voltando agora do centro do Capão, onde trombei os parceiros que assim como eu não puderam ou não quiseram ir para a praia eu pude constatar mais uma vez que apesar de tudo, a família só cresceu, e hoje o time ta nervoso, a casa aqui vai lotar de novo, abraços, apertos de mão, num tem problema, uns boicota de um lado, agente se levanta do outro, uns atrasa, agente se adianta, o trabalho e a criatividade é tudo que temos, mas também é tudo que precisamos.
Aos l a l, lado a lado com nóis, tamu junto, ano 2007, muito mais forte, muito mais comprometido com as responsabilidade de lutar por uma periferia mais positiva.
A Família 1dasul, a Literatura Marginal, us Firme e Forte e eu Ferréz, só tenho a agradecer, pelos que me ensinaram pelo bem ou pelo mal que a vida é a oportunidade de fazer algo melhor todos os dias.
Quem acompanhou esse blog durante todo esse tempo, ou quem já lê meus textos sabe que eu num sou de pagar simpatia, que falo mesmo tudo que penso, então valeu, pois mesmo sem estar na revista, sem estar perto de vocês como deveria, saiba que minhas palavras são muitas vezes estranhas mas são verdadeiras.
Feliz 2007 a quem merece.

www.ferrez.com.br

Salve Rapa, só pra lembrar
Todos os textos que escrevi na Caros Amigos, Folha de São Paulo, Revista Joven Pam, Trip, Rap Brasil, etc. além de textos inéditos, poesias, fotos, videos e músicas estão em www.ferrez.com.br é só entrar e se aculturar.
Tem ainda a música Mil fita, do grupo Tref e o clip da música Periferia Lado Bom.
usem a vontade porque foi feito para vocês.
ano que vem sai o site da 1dasul, com toda a ideologia da marca mais chapada da zona sul de sampa.
abraços Ferréz.

A Caminhada de 2007


Salve, venho através dessa só agradecer aos que votaram na minha pessoa para o prêmio da Cooperifa, recebi um pelo meu trabalho na quebrada (em 2007 a biblioteca vai estar toda reformada) e também peguei o da Revista Caros Amigos, que já tinham entrado de férias e me pediram para cumprir essa missão.
escrevi um texto falando uma pá de um monte de verme que se encostou em nossa arte e está se aproveitando tanto do rap como da favela, mas no final mudei de idéia e preferi valorizar quem somou.
esse ano terminou com muita vitória, onde vi os parceiros do Negredo também recebendo pelo dvd 100% favela, que agente fez numa batalha tremenda junto com a Maureen e a Sophia, kodato sam, Marcinho, e todos os manos da favela Godoi.
Esse ano fortifiquei minha amizade com o Maurício Dts, com o Sidinei e tive vários papos como Sérgio Vaz e com o Buzo, além do Prof. Pablo e do Gato Preto.
tive a honra de receber meu parceiro Fábio (Cebola), e Davi além de ter ganhado um fusquinha maneiro do Robson Canto.
Também ganhei um quadro do Oscar Niemaier e vários livros do Stephen King, além das traduções dos meus trabalhos em Portugal, Itália, França.
Ano que vem já começa mil volts, com o lançamento da coletânia 1dasul, das novas roupas da 1dasul e a revista L.M.
Ou seja, ano que vem o lado empreendedor vai trabalhar bem mais, afinal agora tem muita gente pra dar satisfação, enquanto o escritor estuda e aprende para encher mais um livro que sai quem sabe em 2008.
A todos que me acompanham, ou chegam junto com a 1dasul ou com a Literatura Marginal, saiba que pago muito caro por falar tudo que penso, mas ser honesto com meus pensamentos também me traz muitas amizades verdadeiras e muitas vitórias. Sem vocês eu não seria nada, nada.
Num precisei e nem vou precisar pegar carona em Ong, nem me vender pra plin plin pra poder pagar de revolucionário, pode apostar que eu nunca quis ser mais que isso, um escritor e um cidadão respeitado no meu bairro.
Esse ano fui prejudicado em várias fitas, mas nunca me viram abaixando a cabeça e lamentando, eu fui pra guerra e no final sempre estou erguendo alguma taça.
valeu a todos os parceiros, 1dasulmaníacos, ferrezianos, cooperiféricos, revolucionários, fanzineiros, leitores e fãs do nosso sofrido hip-hop, que a caminhada em 2007 seja mais agressiva e muito mais próspera.
porque de sofrimento basta nosso passado.
Ferréz

Dona Alexandrina (texto inédito especial para o Blog)

Dona Alexandrina.

Num consigo mais fazer isso, por a lata di água na cabeça é mais difícil que caminhar.
Filha minha num estuda, pra que? Pra mandar carta para namorado? Tem que fazer coisa de casa, tem que aprender a ser mulher.
Mas pai.
Pai o que? Qué apronta, ficá cum menino? Vai não.
Foi quando o vizinho interferiu.
Ce vai me disculpá, cada um cria sua filha como qué, mas pra mim cê ta sendo ignorante, essa coisa de mulher ficar em casa já é coisa antiga.
Era nada, tem que casar com alguém de bem.
E se o homem vacilar? Ela fica amarrada num pé de boi? Ela tem que estuda mesmo, pra aprender a fazer as coisas, se virar se um dia o marido faltar.
Num tem condição não, nóis num tem o que gastar, num vai estuda.
Bom, eu vejo essa menina se matando o dia todo ai, dando água e comida pros animal, cuidando da horta, até uma hortinha lá atraz ela tem em particular, então menina o que você tem aqui?
Tem um monte de coisa, umas 3 galinha, um pato, um peru.
O peru nóis vai come no final do ano.
Vai não, é dela, se ela vende então tem dinheiro pra estudar.
Duvido vendê.
Então fui lá no outro dia, comprei tudo que ela tinha, levei uma gaiola e só deixei uma galinha.
No outro dia tava linda, sandalinha, vistidinho novo, cabelo penteado, foi minha mulher que fez as tranças.
Ce num vai estuda não, tem que colher hoje, seu irmão num sabe colher, e tem que fazer farinha.
Eu corri o dia inteiro, colhi, fiz farinha, dei água aos bicho, e depois sai correndo pra escola, minha mãe tentou me pegar, jogou o cipó nas minhas costas varias vezes, mas no final desistiu, ninguém pega moça trabalhadeira assim não, ainda mais minha mãe, que com todo respeito, fica sentada mascando fumo o dia inteiro.
Mas ela num é ruim não, fez isso por meu pai, pedido dele.
Num deixa estuda não. Coisa ruim fica em casa.
Peguei aula, os menino mangou deu no começo, a professora num deixava, brigava logo com eles.
Todo dia era assim.
Hoje cê num vai, vai colher, vai plantar, vai fazer isso, vai fazer aquilo, mas na hora certa eu saia correndo, pegava o vestido a sandalinha e o material da lição e corria pra estudar.
É verdade, teve isso mesmo, bem lembrado, uma vez os meninos me esperavam na saída da aula, queria fazer coisa comigo, sabe né? Eles diz aqui que é currar, lá é outra coisa.
Mas eu sempre na estrada deixava um pé de pau, pra quando eu voltar eu ir tocando já o gado no começo do caminho, e quando eles vieram eu corri pouco, até chegar no pé de pau, peguei e depois de duas giradas tava sozinha de novo.
Isso durou dois anos, fui feliz na sala de aula, a professora me via chegar atrasada, mais obrigações, meu irmão sabia fazer nada, então era tudo comigo.
Sô testemunha mesmo, essa menina gostava de estudar, mas o pai vivia impondo mais coisa, ela trabalhava por três, e depois começou a ir muito tarde pra escola, até num ir mais.
Aprendi depois a bordar, aprendi a fazer bolo, aprendi a costurar, aprendi as coisas de mulher, mas estudar eu não podia mais.
Conheci ele ainda nova, gosto de falar dele não.
Então foi na cozinha em São Paulo que eu me achei, fazia café, bolo, essas coisas, a firma era boa, tem que reclamar de nada não, na verdade eram tudo gente boa, me deram até chance de virar encarregada, porque a outra foi subida de cargo.
Ah! Num fala subida não? ai que vergonha moço, é pouco estudo né, maldito do meu pai.
Bom, e eu falei logo de cara, era boa naquilo, nos lanches e almoço, sabia fazer até conta de cabeça, mas num tia escrita não, num sabia por as palavra em ordem, num podia pegar esse cargo, então fiquei assim mesmo, até que fui mandada embora, a firma tava com dificuldade, e a outra menina era mais nova, eu já tava velha, deram até conselho pra estudar, mas cê sabe né? Chegava em casa cansada, já com duas meninas e um menino, tinha mais coragem não, agora era a vez deles, era a hora deles tenta estuda.
Minha pequena engravidou logo cedo né. To falando da minha mais nova, arrumou um rapaz ai, que só pra nois num é boa pessoa não, e ela acabou ai sozinha, hoje eu crio a menina com ela.
Já o menino deu a estudar, diz que quer ser doutor, mas pode ser doutor sem trabalhar? Fica o dia com os amigos ai de moto, já falei pra ele se aprontar fica sozinho, vai sofrer, porque eu fiz de tudo por esses menino, e só não fiz mais porque tinha pouco estudo.
Ah! Agora dela tenho orgulho sim, a menina se pegou a estudar, assim mesmo do nada, e esse ano ah! Que alegria, fazendo bico ali, vendendo coisa na rua, essa menina ta trabalhando no açougue aqui do lado, o do Pedro, e agora ta querendo fazer faculdade, pode isso? Eu falei que num tenho muito o que fazer, mas uma coisa eu digo, se ela entrar vai ser um orgulho pra mim, porque o estudo fez falta, num vo mentir pro senhor.
Num entendi?
Ah! Essas lágrimas aqui? É de felicidade, os menino tudo grande aí, maior que eu, se ela entrar menino, vou te falar, vai ser um grande orgulho.
O que é isso? Ah! Né nada não, é só uma coisinha, um caderno que comprei ali no bazar, vou dar pra ela, pra ela começar a estudar né?

Literatura Marginal - A Revista


Salve, é isso mesmo, pra quem duvidou vai ficar ruim, mas pra quem acreditou nós tamu di volta.
Literatura Marginal a Revista, sai em 2007.
estamos montando um time nervoso para encher essa revista de litera-rua.
mande seus textos, nós vamos escolher não os melhores, mas com certeza os mais representativos.
o projeto começa a acontecer em fevereiro e em poucos meses falaremos do lançamento.
pra quem não conhece, lançamos a Caros amigos/Literatura Marginal durante 3 anos pela editora Casa Amarela e Literatura Marginal, agora estamos vindo pela editora L.M. que também realizou o livro - Talentos da Escrita Periférica, em parceria com a Ágir.
essa revista é o primeiro lançamento da L.M. editora.
Mas quem gosta de dizer por ai que não faz Literatura Marginal, então nem ouse mandar o texto, afinal esse espaço é pra quem acredita que fazemos parte de uma linguagem diferenciada e de uma nova forma de se expressar.
2007 - o ano da arte escrita.
Ferréz/1dasul

De vorta e firmão

Salve rapa da sul e de todas as quebradas do mundão.
Demorô um poquim mas resolvi meus problema pessoal, pelo menos por enquanto.
hoje mesmo já sai no corre, distribui os panfletos da 1dasul no jardim São Luiz e Vaz de Lima, eu a Elaine e o Davi, um calor do cão e agente enchendo as caxinhas de correio com fotos das nossas roupas, tem que correr nêgo, se não o trem da história passa por cima.
O mais loko é ver que temos um público infantil muito chapado, os muleke vem correndo pra pegar os panfletos da nossa mão, e ai a idéia rola solta.
também passei na casa do Zezinho, onde trombei a Tia Dag e o sangue bom Roberto da Sindicado Paralelo, ele é um dos caras que dão mó força no rap e fica só nos bastidores, um salvão pra ele, pro De Maio, pra Maureen e pra vários que estão na estruturação do bagulho, esses são firmeza total.
no mais, vou estar dia vintão agora na Cooperifa, junto com os manos do Negredo e com us parceiro da favela do Sapo, da Coca-Cola, do Jardim Comercial e do Amália.
tenho certeza que quarta agora vai ser mais um dia de vitória no sarau, e sempre lembrando que tem mano que tá esquecendo, que a fita é mais poesia e menos alcool, ir lá só pra chapar num é contribuir com o nosso gueto.
aos poetas e escritores que ganharam o prêmio todo meu apoio e com muito orgulho, pois nós somos merecedor de levantar a taça.
firme e forte, literatura marginal até o fim, kumigo kem kizé, kontra mim kem pudé, dezembrão de vitória.
em alguns dias um texto inédito pra terminar o ano com muita literatura.
natal sem consumo, mas sim com muito abraço e verdade, família junta num tem preço e nem nota fiscal.
um pé na ficção e 2 na vida real.
Ferréz/1dasul/l.m./

Só NoviDades


Salve, várias novidades antes de se esgotar dezembrão.
se liga só.
20 de dezembro tem o prêmio da Cooperifa, eu muito sortudo que sou ganhei logo como escritor e como produtor do dvd 100% Favela, junto com o Negredo.
E ainda tem mais, se liga só quem nunca viu ou quem só viu partes do trabalho do maior poeta do concretismo nacional saiu uma antologia do Arnaldo Antunes.
Como é que chama o nome disso é a obra definitiva pra quem quiser viver o concretismo, para os saudosistas que quiserem letras desde a época do Titâs e ainda tem vários textos, uma entrevista gigante e várias poesias inéditas, recomendo.
Já pra quem quiser colar e ver uma ótima poesia ao vivo tem o evendo do Zona Branca de Ademir Assunção.
Contos, Crônicas, Livros, músicas, poesia concreta, fotos e muito mais: www.ferrez.com.br

Boicote ao Filme Turistas .

Salve Rapa, desculpe a demora nos posts mas tá foda, muito corre e depois da canseira que levei em Campos do Jordão, vai ser difícil sair daqui novamente, mas vamos que vamos.
Na Travessa Santiago, lugar onde me criei sempre tive vários irmãos, porque amizade é um termo fraco para definir o que éramos, então vira e mexe um desses parceiros me dá um orgulho danado, um deles é o Windsor, mais conhecido por Amaral, que na net tá fazendo uma campanha contra o filme Turistas, quando vejo trabalhos assim de não querer aceitar toda essa merda que está ai é que fico mais convicto que temos uma chance, uma chance de mudar tudo isso.
cada grão de areia forma a praia e não ao contrário.

participem da campanha e boicotem mais essa humilhação, porque quem pode falar dos nossos problemas somos nós, eles que assumam os deles, ou você já viu um filme falando a realidade que Israel promove contra os palestinos? ou o que sofrem os imigrantes na mão dos patrões americanos?
Ferréz
Abaixo o texto do mano

BOICOTE AO FILME 'TURISTAS'
Estou aqui para iniciar uma campanha em massa, e conto com vocês, para BOICOTAR integralmente o filme americano TURISTAS, que estréia lá em 1o de Dezembro e aqui em Janeiro ou Fevereiro, distribuido pela Paris Filmes.
Para quem não sabe, o filme conta a história de 6 jovens americanos que vêm ao Brasil de férias. Chegando aqui tomam uma caipirinha com 'boa noite cinderela', são assaltados, sequestrados, torturados e por fim têm os órgãos roubados por traficantes da industria negra dos transplantes. Alguns morrem e mesmo os que sobrevivem não têm um final feliz.
O filme é classificado como TERROR, comparado ao filme 'O Alberge', e a EMBRATUR já está tão preocupada com a péssima repercussão do filme lá fora que, temendo uma queda brusca na receita do país vinda do turismo internacional, já está preparando campanhas intensas para serem veiculadas lá fora e tentar minimizar os estragos.
Façamos então a nossa parte. Vamos fazer deste absurdo, pelo menos aqui no Brasil, um fracasso total de bilheteria.
NÃO ASSISTAM, NÃO DÊEM $$$ A UMA PRODUÇÃO QUE SÓ VISA DENEGRIR NOSSA IMAGEM.
Só pra se ter uma idéia, o trailer começa com a frase: 'Num país onde vale tudo, tudo pode acontecer!!!'
Passem essa mensagem para o maior número de pessoas, pois eu considero que seja nossa obrigação não passar nem na porta dos cinemas que estejam exibindo esse filme.
Amaral Windsor

Literatura é compromisso


Vamos que vamos que o ano num acabou.

dia 6/12
lançamento do poeta Sérgio Vaz.
Livro: Colecionador de Pedras.
Local: Sarau da Cooperifa no bar do zé batidão
Rua Bartolomeu dos Santos, 797
Chácara Santana, zona super de Sampa city.
eu vou estar lá para essa grande festa.

Dia 8/12
São José dos Campos
Palestra as 13:30 hrs.

Dia 10/12 Palestra no evento Periferias Ativas
a partir das 14:00 hrs.
Rua Maria Antônia 283 Próximo ao Mackenzie.
Presença de vários grupos de hip-hop, de poetas e escritores.

Dia 10/12 Show no Jardim Jangadeiro (Ferréz e Negredo)
Presença confirmada de Happin Hood e Consciência Humana.

Dia 13/12 Cásper Libero
Vou estar presente na apresentação do trabalho do Thiago sobre o livro Capão Pecado.

Dia 16/12 Palestra em Brasilia
Evento cultural.
participação no mesmo evento de Gog.

Retrospectiva 2006 (a Revolução)































Somando com os livros do Ridson Du gueto, Sacolinha, Allan da Rosa e ainda com Cd's como do Periafricânia, Dexter, Negredo, X (Câmbio Negro) e muitos outros, esse ano foi um ano tão cheio de vitórias que com certeza não podemos por em palavras.
então talvez imagens seja melhores para que vejamos e assim possamos acreditar e cada vez mais valorizar a nossa cultura.

um grande abraço a todos que somaram nas caminhadas desses guerreiros, porque agora é hora de comemorar, para reativar as baterias para 2007.
um brinde a nossa vitória, dignos de toda glória.
Ferréz.