Dia 20 de novembro é o dia da Consciência Negra. Feriado aqui em São Paulo. Como sou branco e minha consciência não deve valer grande coisa (que eu saiba não tenho um dia para comemorá-la) resolvi levar a sério a entrevista que Mano Brown, o intelectual do Jardim Ângela, deu para o jornal Folha de São Paulo.Há dezoito anos se esquivando da imprensa a pretexto de conservar a virtude de suas convicções e/ou a pureza do movimento hip hop (ou algo que o valha), Mano Brown, o intelectual, o mito, a lenda viva da periferia de São Paulo, finalmente veio a público.Talvez tenha dado outras entrevistas ao longo desse tempo. Confesso que não acompanhei. Consta que foram poucas. Mas essa entrevista, em especial, foi reveladora."Os pretos - diz Brown - não têm todos as mesmas idéias". Ah, meu Deus. Será que ele fez essa declaração por ignorância ou foi por racismo mesmo? Vejamos. Embora Mano Brown tenha feito esse comentário baseado no estremecimento de sua relação com o rapper Thaíde, a simples generalização, a meu ver, atingiu toda a comunidade negra - o que por si só é um fato gravíssimo: se Brown não foi racista por opção, foi por incompetência. A pergunta é: o que eu, um branquelo entediado com toda essa lenga-lenga, tenho a ver com isso?A princípio, digamos que senti falta de um dia para comemorar minha consciência. Então, na falta de uma, resolvi investigar o que Brown, um sujeito dotado de uma consciência - em tese e oficialmente - superior à minha, teria a dizer sobre assunto.Asneiras, disparates, tolices. Ele deve ter chegado a essa conclusão racista "os pretos não têm todos as mesmas idéias" depois que constatou que pretos podem - inclusive! - pensar como brancos (e vice-versa).Uma multidão de garotos (não só da periferia e não exclusivamente de São Paulo) sem esperança - e intelectuais de alto quilate e igualmente deslumbrados - o tem como um ideólogo, guru. As palavras de Brown têm o peso incontestável da realidade. Nelson Motta o considera um gênio. Não se discute a autoridade de Brown. Porta-voz da periferia que amedronta a classe média, ele - para dizer o mínimo - é a verdade, o código, o cara.Brown votou em Lula pelo "olhar e pelas idéias dele". Seguindo esse raciocínio, o filósofo do Jardim Ângela poderia ter votado em Lembo pelas sobrancelhas, em Alckmin pelo nariz ou em Mercadante pelo bigodão tingido.O problema é que Lula, o candidato a quem Brown pediu votos, às vezes, tem algumas idéias de cores duvidosas e não raro demagógicas. Marta Suplicy também. Foi ela quem inventou o Dia da Consciência Negra . o dia em que Mano Brown proclamou seu desastrado racismo no jornal Folha de São Paulo, 20/11. Entre outras bravatas, o revolucionário Brown disse que está feliz da vida porque os bares da periferia perderam espaço para as pizzarias, salões de beleza e locadoras. Esqueceu das Igrejas. Bispo Edir Macedo deve compartilhar da mesma felicidade de Brown. Mas o rapper vai além. Tem sonhos românticos. Ele sonha com "a população ouvindo música nas ruas, fazendo academia, cuidando do corpo". Talvez inspirado em Galvão Bueno... antevê algumas "metas". Quem sabe não queira ver Felipe Massa cruzando o pódium ao som do Rap da Vitória. Brown é nosso guia. Brown apóia incondicionalmente a prática de esportes... e não "abre as pernas" para a mídia de jeito nenhum. Sei, sei. Sua palavra é lei. De um lado e do outro da Ponte João Dias. Outro dia o furioso Brown foi condecorado por Lula. Não sei se compareceu à solenidade ou enviou algum representante. Che Guevara deve ter dado cambalhotas de orgulho na tumba. O bigodinho e a carranca de Brown, aliás, nunca me enganaram. Alguém precisa explicar a ele o significado do termo facista.Nesse caso não há tropicalização que amenize o racismo (involuntário?) de Brown. Brown é o começo do fim de Sérgio Buarque de Hollanda. Viva a Revolução das Periferias - aliás, a rede Globo e Regina Casé apóiam qualquer iniciativa que venha das periferias, não importa se é a periferia de Ruanda ou do Grajaú. Se é periferia tem talento .E se tem talento tem verba. Tem cinema, tem indicação para o Oscar. Tem droga para os filhos da diretoria. Tem alguma ONG pra administrar o negócio.Brown também acha que o fato de o irmão de cor "se vestir melhor faz muita diferença" . Além de estúpidos "porque pretos não tem todos as mesmas idéias", Brown deve considerar que uma roupinha pode disfarçar a feiura dos seus irmãos pretos.As declarações de Mano Brown, porém, não me espantam. O que me espanta é o medo e a veneração que a mídia tem por esse racista desastrado. Se eu fosse negro, o processava. Mas como sou um branquelo sem consciência (e sem calendário) só me resta lamentar a entrevista e o espaço exagerado que a imprensa - ao longo dos anos e a despeito da aparente falta de interesse - concedeu/concede a Mano Brown, esse títere do desespero. A situação - já fiz essa analogia uma vez - lembra muito os assaltos a mão armada: onde a vítima (ou o consumidor tanto faz) não tem opção diferente da submissão. Os especialistas - todos - nos ensinam a não reagir. E agora. O que se faz? O talento musical de Brown justificaria essa rendição incondicional?Me parece que não é esse o caso. O maestro Júlio Medaglia me fez acreditar que não
extraído da: http://www.revistamuro.kit.net/
Texto escrito por ocasião do dia da consciência negra, quando Mano Brown concedeu uma entrevista ao jornal Folha de São Paulo, em 20/11/2006.

Esse ai é o cara, Marcelo Mirisola, como não temos um e-mail de contato para debater com ele, quem tiver perto pode encontra-lo na praça Roosevelt, num lugar chamado Sebo do Bac.