Os selvagens da noite (texto para o livro Warrriors - Selvagens da noite - Sol Yurick)
E a trama começa com o grito do primeiro cagueta que vi na minha vida. Com um copo de café na mão, estava com mais 3 amigos na sala do Ronaldo, dentro da favela do Jardim Comercial.
Depois do filme, estávamos na viela, encostados num poste de madeira, até que um pé de pato passou com sua Lurdinha, o nome carinhoso que ele dava para sua arma, e agente se escondeu na garagem para ele não nos matar. O pedido foi feito pelo dono do imóvel que não gostava de ver esse bando de “maloqueiro” na porta dele.
Depois disso, cada qual quis montar sua gangue, mesmo sem bem saber o pra que e porque, agente não tinha o metrô, mas tínhamos as longas caminhadas, para se curtir um “som de rua” em outra quebrada. Agente não tinha os coletes de couro, mas tinha os moletons, a verdadeira farda da periferia.
Depois do filme ser repetido a exaustão, era inevitável a influência, e as gangues surgiram, seja no rock de periferia, nos motoqueiros, no punk local, nos clubes de trucos, nas marcas periféricas e o movimento rap que ainda usa uniformes de baiseball e tem na zona sul o boné mais vendido sendo feito por um fabricante de baseball. Anos depois a influência ainda era visível também no movimento Clubber. e os motoqueiros e suas jaquetas de couro.
Todo jovem procura algo pra se identificar, apesar dos muros que distanciam culturalmente nossa realidade do resto da cidade, temos uma cultura paralela geralmente negligenciada pelas editoras, produtoras e afins.
Nossos olhos vidrados na tela, enquanto o pai do Ronaldo gritava da cozinha. - Esse filme passou semana passada, vocês não enjoam não?
Era mais cultura que crime, e o filme tinha já na sua fala inicial um grito de união, uma discurso de direcionamento onde tudo fazia sentido, a cultura de massa ali não teria vez.
Nada mais estranho do que depois isso virar Hollywood, mas a grande mídia não comeu muito disso, e tentou abafar o filme, viu que o que tinha na mãos mudava a visão das pessoas, e esse era o motivo do filme só passar de madrugada. Desculpa ai Sr. Luiz, agente promete que num vai mais ficar até as 3 da manhã na sua casa.
A característica da periferia de São Paulo é única, como na Zona Leste e o grupo Consciência Humana e suas roupas vermelhas, o DRR (Defensores do Ritmo Rua) e as marcas da Zona Sul, como o laranja e preto da Fundão, o preto e branco do Negredo e o dourado e preto da 1DASUL.
The Warriors fala de uma coisa universal, a busca, e prova de que independente de qualquer mascara, figurino, amigos, ou ideologia, no fim você continua caminhando numa estrada sem destino pré estabelecido, isso é se você se livrar das cordas que eles colocam a todo momento para guiar as marionetes.
O autor que fez o livro sem muitas expectativas, estava claramente confortável na narrativa, tanto por sua experiência como assistente social, como pela convivência com a rua.
A literatura quando agrega esse viver, tem grandes livros, como é o caso do jornalista e militante Stieg Larson e sua trilogia Milênio.
Se em Milênio você sabe que a exploração das mulheres é real, em The Warriors, você tem certeza que o autor andou por aquelas ruas, ouviu aquele rádio. Ele narra o fato de dentro, ele é parte do tema.
Se alguém lhe perguntar porque em pleno século 21 você está lendo um livro sobre gangue. Diga, que hoje mais do que nunca, somos comandados por elas, tanto no modelo oficial, como no paralelo.
Tony Scott anunciou que faria uma refilmagem de The Warriors, dizem que cometeu suicídio em 2012 na ponte Vincent Thomas, em Los Angeles, logo o berço dos Bloods uma das mais perigosas gangues do mundo. Eu ousaria dizer, que no dia alguns caras também foram vistos na ponte, e um deles gritou: - Foram eles, os guerreiros!!!
Ferréz
Escritor
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