Assistindo e sendo humilhado. (Ferréz)
Na verdade eu já pensava em escreve esse texto a uns quatro anos atraz, desde que fui ao cinema com dois amigos, um deles era o Alex, assistir ao filme “Um dia de treinamento”, com Denzel Washington.
Quando acabou o filme, eu tava tão nervoso, tão irritado, que na hora que o Alex elogiou o filme eu simplesmente sai andando.
Os caras já sabem como sou e foram perguntar o que tinha acontecido, disse que como o Alex sendo um cara negro num tava revoltado vendo um filme, onde o único cara bom é o branco de olho azul, que passa um dia inteiro, com outro policial negro que o ensina a bater em latinos e em outros negros.
Mas na verdade ele tinha gostado tanto do filme, que junto com o outro parceiro nem ligaram pro que eu tava falando.
Depois disso, foram inúmeras vezes que abandonei sessões pela metade, filmes que me davam nojo, vontade de pegar meu dinheiro de volta no cinema ou na locadora, assim como alguns filmes feitos com atores negros que passam na TV, estereotipando o povo negro como se todos bebessem e fumassem maconha, além de incentivar a violência e desvalorizar as mulheres. Oh! Malcon ainda bem que você não está vendo isso.
O seriado que passa no SBT, a família tem 7 jovens Estadunidenses, (todos loiros) um olha pro outro e fala como o irmão é burro e completa.
- Desse jeito você não passa de ser presidente do México.
Já no filme O exorcismo de Emely Rose, o ajudante da advogada de defesa fala em certa parte do filme.
- A maioria dos casos de exorcismo é no terceiro mundo, claro, gente primitiva e supersticiosa!
E não para por ai, até em desenhos agente é contaminado, no desenho Super Amigos, os maiores heróis da terra (todos eles Estadunidenses) enfrentam a grande Rainha Negra Vudu, com todo tipo de colar, magia e tudo que tem direito.
Agora, um dos filmes campeões em preconceito e no mal gosto é “Um gigolô por acidente na Europa”.
Quando o personagem principal (Estadunidense) amarra outro personagem (Europeu) num poste com a frase: “Viva a América , a Europa fede a bosta”.
Em seguida os europeus passam e jogam coisas nele, o chamando de porco.
E o filme segue pregando a guerra étnica.
No mesmo filme, num ônibus quando o personagem principal vê um senhor tocando acordeom, sai tocando o nariz e com a outra mão coçando a cabeça, e diz.
- É a dança dos negros sujos.
Já no filme “Dois é bom, Três é demais”, o personagem Dupret, interpretado por Owen Wilson, quando vai dar uma palestra na escola, no trecho que fala das profissões, toda vez que cita uma profissão a câmera mostra uma criança branca, quando fala na parte do esporte, a câmera focaliza um menino negro.
Mais o pior ainda vem, quando ao se referir em não gostar de trabalhar ele cita a Europa e América do sul dizendo que “nós entendemos bem isso”, depois ainda diz que conheceu uma mina Argentina e lá todo mundo fica a toa na vida.
De volta aos desenhos animados, a Dreanworks é campeã no preconceito, vou pegar só um exemplo que já basta, o desenho “Por Água Abaixo” que traz a história de um ratinho rico que morava sozinho e descobre um mundo muito mais divertido no esgoto (alusão a solitária elite e a tão super lotada favela?). A história se passa, até que aparece um assassino, que é um sapo e é francês. Quando o grande vilão, que também é um sapo conta sua história triste, sobre como ele era um sapo muito querido do príncipe Charles e acaba sendo jogado na privada, antes de terminar de contar a história ele nota o rosto de chacota do assassino francês e pergunta. – Você está zombando do meu sofrimento? No qual o francês responde: - Claro, desde que não seja o meu sofrimento, afinal sou francês.
Em seguida o francês toma um gole de vinho francês e cospe no chão, desdenhando do vinho. O Desenho segue com dezenas de tiradas aos europeus.
Depois, seguindo a trilha de desgosto, ainda posso citar a série The Shield, sobre o cotidiano de policias americanos, que passa no canal AXN, numa das cenas, o policial entra na casa de um latino e vê que todos os mantimentos estão podres, e logo diz; - vocês do terceiro mundo não tem geladeira em seu pais não? Que nojo!
Ou o trecho do seriado recém lançado, Jericho que trata de uma explosão nuclear em alguns estados americanos, e de alguns sobreviventes numa pequena cidade.
Em um capítulo recente o ex:prefeito aparta uma briga de dois moradores e grita algo como: - nós não nos tornaremos selvagens como os animais de terceiro mundo em suas vilas.
Será que além de não poder escolher o que assistir, em nenhuma grade de programação, em nenhum canal, pago ou não, apesar de todos os canais serem somente “concessões”, não poderemos sequer deixar de ser humilhados todo o tempo?
Isso sem mencionar o tanto de bandeira estadunidense que agente já engoliu nos filmes, toda hora tem que ter algo para nos lembrar, que eles são “superiores”. Com uma verdade absoluta, agente via engolindo legenda atrasada, legenda errada, falta de legenda e por ai vai, que numa eterna tradução agente vai aprendendo a força que ou agente fala e lê em inglês, ou não sabemos qual lanche pedir, em que loja está em Sale, ou em promoção, ou como vamos arrumar um Work, ou trabalho, e parece mesmo que deixamos de ser colônia de um, para ser do outro.
Esse texto na verdade é infindável, porque sempre que estou assistindo algum filme ou seriado eu identifico o preconceito nele e corro para somar mais no texto, mas como todo filme, tudo tem um fim.
Espero mais filmes nacionais, mais seriados, mais produções honestas, que ao contrário da produção deles, somente traga histórias para entreter, sem maldade, sem querer fazer ninguém de fantoche, nem magoar nenhuma etnia.
Só espero que os bilhões gastos nas produções hollywoodianas sirvam para algo além de tentar provar que eles são superiores a nós o tempo todo.
texto do livro Cronista de um tempo ruim - editora Selo Povo.
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4 comentários:
É realmente um absurdo esta indústria cinematográfica que veicula MASSIVAMENTE um discurso branco, das elites dos impérios europeu e estadunidense, e permanecem colonizando as subjetividades. Também sinto falta de mais produções que borrem o sistema.
A primeira SUPER produção gringa, "O nascimento de uma nação" é uma exaltação ao KKK. Não tem muito o que se falar a mais sobre Hollywood...
Pode crer, Férrez!!!
Li esse texto no seu livro "Crônista de um Tempo Ruim" e achei sensacional.
Muitas vezes, nós entretidos com algum filme, acabamos por não perceber as suas Mensagens Subliminares, e aí é que mora o perigo, manifestações preconceituosas das mais diversas e covardes.
Abre o olho periferia ....
Paz aos que merecem!!!
Paulo Brazil!!!
Blog Olha Onde a Favela Chegou.
Por isso deixei de assisitir aos filmes deles, faz muito tempo. E nem dou esses filmes pros meus filhos. Tem muita coisa boa por ai pra substituir essas bostas. É preciso criticar, pôr na mesa os preconceitos deles, mas tambem recusar, não dar dinheiro pra ver isso, buscar paralelamente outras coisas que valem a pena.
Valeu Ferrez!! Trabalho de escritor é sacar isso e mostrar quer a maior parte dos preconceitos não são bem nossos, mas foram costruidos em nós.
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