Blog do escritor Ferréz

A caminhada continua


Hoje amanheci com muita saudade do meu tio, meu amigo de caminhada, hoje caminho fisicamente sozinho, mas sei que espiritualmente ele está do meu lado, dizendo assim - Vamo só parar em Itapecerica?
E pra ele com muito carinho fiz esse texto.



A caminhada continua.


Cheguei cedo, para mim pelo menos, umas 7 da manhã, parei o carro e já bati com força no portão, ele estava em cima do muro como sempre, os braços apoiados.

Fala Nal.

Sempre me chamou assim, apelido de infância.

Sorriu, desceu e abriu o portão, a camiseta branca regata, o short surrado, e o tênis bem estilo bamba.

Minha tia falou lá do alto da casa. - Quer café Vim?

Outro apelido de infância.

Não tia, to de boa, vamos tio?

Saimos como toda semana, o passo apressado, uma conversa qualquer enquanto a periferia ia passando, com seus bares ainda fechados, seus cachorros nas ruas ainda limpas e os carros com sereno nos vidros.

O Valo-Velho passava rapidamente e logo a estrada de Itapecerica ia se mostrando, larga e poderosa, com seus postes sempre mais altos.

Então o gerente da Requipe disse que ia me mudar de rumo, eu falei pra ele que...

Meu tio era assim, falava como se agente tivesse vivido o tempo todo junto, não importava o que era
Requipe, quem era o cara que ele dizia ser seu chefe, a história ia sendo narrada como se fosse tudo familiar, eu tentava pegar a moral da história.

Agente tinha que ir para a contra mão, pois quando começava o acostamento da avenida não da para confiar em ir no mesmo fluxo dos carros, uma vez um caminhão passou raspando no braço dele, nunca mais demos as costas.

O sol começava a se descolar, eu lembrava porque trouxe boné, ele sempre caminhava sem, a pele morena, o andar reto, o problema que tinha no braço depois do primeiro AVC.

Uns 25 minutos de caminhada, ele encostou num tronco perto do ponto de ônibus, abaixou as vistas pro short e retirou, eu olhei pra ele e não sabia se ria ou se achava ruim, tirou o cigarro e o isqueiro.

É só um Nal, já agente continua.
Não tinha como brigar, o tom que ele usava era tranquilo e firme.

Os carros passavam rapidamente, ele fumava e olhava para a estrada, eu tentei achar um lugar para sentar, na guia mesmo era o jeito.

Pronto, só foi eu sentir as pernas descansando que ele terminou, agente acelerou de novo, embalamos na descida, era hora de entrar no caminho mais estreito, sair da avenida principal e caminhar numa pequena estrada de terra.

Hoje ali tudo virou a obra do Rodoanel, passa uma ponte por cima, isolaram o rio, mataram muito animal silvestre.

E ele emendou outra história, de quando chovia gelo e ele pegava pra chupar com seus irmãos, emendou outra de quando era caminhoneiro e saia por ai pegando as cargas, de como uma senhora tentou lhe vender uma santinha no meio do caminho, ele tinha parado o caminhão pois as cordas viviam soltando, depois que comprou a santa, as cordas não soltaram mais, quando chegou na hora de descarregar, já em São Paulo, tiveram que cortar as cordas, pois o nó estava muito forte, olhou para a santa dentro do caminhão e agradeceu.

A estradinha de barro, tinha algumas poças de água numa delas meti o pé, me segurei, nunca falei palavrão na frente do meu tio.

Viramos, subimos mais um morro, descemos por uma encosta, passamos paralelo a um antigo moinho e lá vinha mais uma história.
Aqui funcionava o frigorífico Éder, era tudo deles, ai o banco tomou, mas antes o filho gastou tudo com cachaça...

E a histórica continuava, e os passos já estava mais lentos, pelo menos os meus.

Finalmente fizemos a curva e saímos numa estrada maior, em 5 minutos de subida, estavamos na Itapecerica novamente, a volta sempre parecia mais rápida.
Passamos pelo cemitério da paz.

Finalmente chegamos no Valo-Velho, no Rondon, lugar onde vivi na casa do meu tio com meu pai até os 4 anos de idade.

Minha tia tinha a mesa pronta, pães, manteiga, café quente e leite.
Vocês foram muito longe hoje?

Fomos um pouco tia, o tio Élcio anda demais.
E ele fumou no caminho?

Nada, nem paramos para nada.
Meu tio me olhou com um pequeno sorriso, quase imperceptível.

O tempo foi passando, as obras do Rodoanel avançaram, a caminhada foi mudada, adiada, muitos compromissos iam me tomando o tempo.

Meu tio ficou doente, tossia muito, não tinha mais convênio, não conseguia médico, o posto de saúde marcou os exames, nunca chegava o seu dia na fila.
- Trabalhei a vida toda, agora preciso de médico e não tenho.

Um dia ele piorou, eu liguei para um amigo político, consegui falar com um assessor, ele ligou, outros ligaram, conseguiram marcar com uma responsável pela comunicação de um hospital, fomos todos para lá, mesmo assim fomos parar no corredor, meu tio numa cadeira de rodas, não tinha maca disponível, não tinha vaga disponível, não tinha ninguém disponível.

Ele era forte, foi ficando magrinho, ali na cadeira, no corredor, no meio de tantos, não contava mais histórias, não tinha mais o sorriso de antes.
Agente comprava lanche para ele, o hospital não podia dar nada para quem não estava internado oficialmente, a nora ajudando, minha tinha levando no banheiro, esperando esvaziar, muita gente em situação de rua usando também.

Um médico passava, dava esperança de uma vaga, mais uma madrugada todos ali em volta da cadeira, conseguimos pegar uma maca, ele deitou algumas horas, fomos no banheiro com ele, pegaram a maca.
Uma senhora de uns 50 anos, suava na minha frente num banco, foi abaixando a cabeça até não existir mais.

O chefe dos médicos mandou ele pra casa, não tinha mesmo vaga, não ia ter vaga, ele tinha que marcar no posto. - Mas doutor, tem meses que ele está nessa fila do posto, ele tá muito mal, como vai esperar?
Marcaram uma biópicia, o resultado saiu.

Já em sua casa, o filho comprou uma cama igual do hospital, a nora cuidava como enfermeira.
Alguns dias depois fui caminhando num lugar verde bonito, pouco depois do Rodoanel, pela mesma estrada de Itapecerica que agente caminhava junto para levar flores, ele não sentiria mais seu perfume.

Élcio Burgos deixou 2 filhos, 4 netos, uma esposa e um sobrinho e amigo de caminhada.

10 comentários:

Unknown disse...

Muito bom Ferrez! Moro no Santa Júlia, município de itapecerica da serra, e lá o rodoanel também assolou a única área verde, perto da escola onde estudei. Hoje mal me lembro como era antigamente, há uns quatro anos. Enfim muito boa a história. Ah, sou o Wesley. Estive lá na 1 da sul.O meu e-mail é esse aqui: Wesleyacessa@gmail.com

Unknown disse...

Oi Ferrez!Muito boa a história.

Unknown disse...

Fala Ferres meu nome é Bryan eu tenho 13 anos gosto do seu trabalho especificamente da quele que vc tenta criar uma biblioteca na favela.
gostaria que me responde-se vou deixar meu email para cv responder

bryan.tosty@Gmail.com

valeu
um salve para vc e sua turma
FUI

Unknown disse...

nós os alunos do 7°ano B da escola Abílio Alves marques em bebedouro(SP),gostamos e achamos muito interessante sua história(a caminhada continua),sua criatividade é grande.Também sentimos muito pela morte de seu tio,mas não fique triste como você disse ¨a caminhada continua¨.Conhecemos seu blog através do professor de língua portuguesa (Sandro),ele demonstrou e explicou como você é um grande escritor e com isso nos ajuda a fazer o nosso projeto (fanzine).
Queríamos também que você nos desse algumas idéias sobre o jornal(fanzine),que vamos construir.
beijos e abraços
Ashley Teixeira dos Santos.
Luana Alves Fernandes.
Wesley Augusto.
esperamos sua resposta

Unknown disse...

nós os alunos do 7°ano B da escola Abílio Alves Marques em Bebedouro(SP),gostamos e achamos muito interessante sua história (a caminhada continua),sua criatividade é grande.
Também sentimos muito pela morte de seu tio,mas não fique triste como você disse ¨a caminhada continua¨.
Conhecemos seu blog através do professor de língua portuguesa (Sandro),ele demonstrou e explicou como você é um grande escritor e com isso nos ajuda a fazer o nosso projeto (fanzine).
Queríamos também que você nos desse algumas idéias sobre o jornal(fanzine),que vamos construir.

Unknown disse...

a História bem interessante conta fato do de um rapais que fazia caminhada com seu tio que era fumante esse tio contava varias coisas que aconteceu. no seu passado,contava historia de quando era caminhoneiro e de como que se dava bem com seus irmãos.passou de um tempo.ficou doente e acabou falecendo
gostamos muito principalmente o vim se dava bem com nal tenho certeza que os outros jovem também gostaram pois conta em linguagem informal o ferres sempre manja nas historia.
conhecemos o blog através de algumas atividade que estamos realizando.na escola
ALUNOS wellington,igor e ana clara

Unknown disse...

a História bem interessante conta fato do de um rapais que fazia caminhada com seu tio que era fumante esse tio contava varias coisas que aconteceu. no seu passado,contava historia de quando era caminhoneiro e de como que se dava bem com seus irmãos.passou de um tempo.ficou doente e acabou falecendo
gostamos muito principalmente o vim se dava bem com nal tenho certeza que os outros jovem também gostaram pois conta em linguagem informal o ferres sempre manja nas historia.
conhecemos o blog através de algumas atividade que estamos realizando.na escola
ALUNOS wellington,igor e ana clara

Unknown disse...

a História bem interessante conta fato do de um rapais que fazia caminhada com seu tio que era fumante esse tio contava varias coisas que aconteceu. no seu passado,contava historia de quando era caminhoneiro e de como que se dava bem com seus irmãos.passou de um tempo.ficou doente e acabou falecendo
gostamos muito principalmente o vim se dava bem com nal tenho certeza que os outros jovem também gostaram pois conta em linguagem informal o ferres sempre manja nas historia.
conhecemos o blog através de algumas atividade que estamos realizando.na escola
ALUNOS wellington,igor e ana clara

Anônimo disse...

A história é bem interessante, conta fatos de um rapaz que fazia caminhada com seu tio que era fumante. Esse tio contava varias coisas que aconteceram no seu passado.
Passou algum tempo, ficou doente e acabou falecendo.
Gostamos muito da história principalmente porque o garoto se dava bem com seu tio Élcio, tenho certeza que outros jovens também gostaram pois conta em linguagem informal. Ferréz, você sempre arrasa nas histórias e textos!
Conhecemos o blog através de algumas atividades que estamos realizando na escola.
Abraços! Ana Clara, Igor e Wellington.

Anônimo disse...

A história é bem interessante, conta fatos de um rapaz que fazia caminhada com seu tio Élcio que era fumante. Esse tio contava varias coisas que aconteceram no seu passado. Passou algum tempo, ficou doente e acabou falecendo.
Gostamos muito da história principalmente porque o rapaz se dava bem com o seu tio, tenho certeza que outros jovens também gostaram pois apresenta em linguagem infornal. Ferréz, você sempre arrasa nas histórias e textos!
Conhecemos o blog através de algumas atividades que estamos realizando na escola.
Abraços! Ana Clara, Igor e Wellington.