Blog do escritor Ferréz

Voltei e estou armado

Estou armado, talvez seja preso por porte ilegal de inteligência, e passe a vida inteira em prisão aberta, pagando uma grande pena e vendo um país ir pro buraco.
Minha pena seria notar a empresária que gasta vários salários mínimos com seu lindo cachorro, mas quando a diarista quer subir 10 reais na faxina, reclama, fala da situação do pais, que se ela não quiser ficar, vai ter fila pra substituir.
Talvez eu tenha que fazer comparação, como pensar que no Egito acharam indícios que pra construir as pirâmides, os construtores ganhavam cerveja como pagamento, o que mudou vendo os trabalhadores lotando os bares depois que chegam do serviço?
Bispa esconde dinheiro dentro da bíblia mas pro fiel cego e louco por alguma salvação tudo passa batido e é explicado, ela é inocente, quem acusa é o diabo.
Carnaval tem como tema a cultura portuguesa, os descendentes de índios se vestem para homenagear o seu algoz.
Vivo correndo esse risco, e me torno testemunha do sofrimento alheio, nada explica a falta de um grupo guerrilheiro que vai para o senado e explode tudo, nada explica a cabeça baixa, a humilhação diária aceita por todos, a espera pela copa do mundo, o novo capítulo da ilusão televisiva.
Sou candidato a escrever o futuro manual prático para libertação, a solução é criar célula terrorista e estudar o porque, mesmo depois de tanto tapa na cara, o povo está risonho e otimista.
Não? Sou radical? Então quando ver o jornal com um P.M. estraçalhando criança na favela, muda de canal e procura algo que fala de ioga e budismo, procura a sua paz espiritual, enquanto o menino continua tentando entender o que fala a professora, não sabendo que no senado aprovam projeto para que ele seja preso ainda no berço.
A solução é todos estudarmos química, aprender a fazer bomba e mostrar o nosso verdadeiro lado homicida?
Talvez não, mas até quando a submissão?
Ninguém mais vai lutar só pelo feijão na panela, o opressor vai pagar bem mais do que só os dólares para sair do cativeiro.
E o mais da hora é que não vão poder nos acusar, nenhum “pobre” pode disseminar o ódio, nenhum “pobre” pode estimular a matança, porque não somos nós que promovemos a desigualdade, não somos nós que negamos o básico, não somos nós que juntamos dinheiro que nem em cem vidas gastaria.
Não vem com conversa fiada, com suas frases de efeito “somos todos iguais”, “desse lado e do outro do mapa”, ninguém é igual com diferente sofrimento. Ninguém permanece igual depois de tanto desgosto, de ter filho furado e jogado no poço, de ver sua mãe se acabar na pinga, de ver o padrasto tentando penetrar o menino de sete anos.
Volta pro mundinho de ficção, tentar ser outro alguém pra não enxergar, que o país perdeu a direção, que o único homem que já acreditamos nos deu uma palavra durante seu mandato. Traição.
Temos que ser duros com os bandidos, fala o presidente, mas gastar em excesso no cartão corporativo pode.
Num país que, infelizmente, o pedinte não entende a constituição, oportunista faz filme pornô e ganha programa diário pra criança.
A favela do Brasil só interessa se tiver algum preto jogado no chão baleado, pro gringo olhar e falar como somos parecidos com nossos antepassados da África.
O bagulho ta mó zona mesmo, e os abutres de terno e gravata estão isolados nas suas torres de marfim.
Mas ainda tem coisas que me divertem, saber que alguns nunca vão saber se o prestador de serviço é quem ele diz ser, nem se a empregada nova tem filho preso ou neto psicopata, esse é o preço de estar do outro lado da guerra, vão andar como cegos, num estranho pais de uma cultura homicida.
A apologia é feita no caixote que serve de armário no barraco, no pedido do filho por mais um pão e o saco sem nada, pela humilhação na fila da igreja, pela esmola da cesta básica.
Só o que escrevemos é nocivo pros porcos ricos, que dizem não saber o porquê de tudo isso, enquanto na bolsa de valores milhares de vidas são determinadas com jogadas especulativas.
A sessão de cartas foi apelativa, todo mundo contra o pretenso contista, que ousa ser escritor e dar opinião contra o artista global, que ousa pensar em época próxima ao carnaval, que ousa questionar a propriedade e defender marginal.
Num país que abriga garotos de recados como Reinaldo Azevedo, especialistas em defender a elite como Alba Zaluar, e o diretor de redação da Época e juiz nas horas vagas, Hélio Gurovitz.
O que é mais louco é que não deixei de comer um dia por causa do “folhetim”, não deixei de abraçar um parceiro em nenhuma viela, e pelo contrário, do lado de cá recebi parabéns até a mão cansar, porque desse lado do muro, os caras sabem como a realidade está.
Vou escrever para ficar registrado, fala pro seu filho que não vai entender meu livro andando de blindado, que não vai captar o estilo do rap estando na mansão enclausurado.
Sem esperar mais nada do que conseguir uma goma, depois do sonho realizado agora é mais ideologia, sonhar em ver em chamas o Projac.
A paz está morta faz tempo, a pomba foi estraçalhada já faz algumas décadas, no céu não se vê mais os desenhos das nuvens e sim os jatos levando os anjos decaídos que controlam esse país submisso.
Avisa a corja, estou de volta e armado.

Dedicado a Marina Amaral e Thiago Domenici

Ferréz

8 comentários:

Anônimo disse...

"Uma luz que não se apaga, um sonho não concretizado, uma ferida sendo medicada, uma voz por todos os lados". O texto aborda, mais uma vez, a hipocrisia dos meios de comunicação, da burguesia e da classe política brasileira. A preocupação é com o setor imobiliário dos EUA, com o aumento do dólar e bolsa de valores. Mas quem olha para a periferia? e a classe trabalhadora? Com tantas inquietações, o melhor é compartilhar com as suas leituras. Amanhã mesmo, vou ler o texto para os alunos. Isso sim, é matéria de estudo e objeto de pesquisa.
sempre na luta e totalmente armado.
Prof Washington.
Piracicaba/SP.

. disse...

A paz tá morta já faz tempo já, e somos obrigados a falar bonitinho, num país hipócrita e frio como esse. Quem critica Facção na minha frente, recebe rajadas de verdades no meio da cara. Eu sou Rapper de verdade, não vou cantar esperança, por quê não vendo ilusão. tem muito grupo de RAP querendo cantar bonitinho, pra ganhar as migalhas do empresário rico, tem muito Rapper querendo acabar com o estilo do Inquérito, Tref, Negredo, Facção Central, Realidade Cruel, Fato Realista, pra querer cantar seus versos de paz mentirosa, e mentiras nojentas, sobre bailes, mulher e bebidas. Aqui é Fato Realista, eu to na guerra, não quero a merda da migalha do cachê do empresário falso, e quero um pouco de justiça, quero o Férrez na Caros Amigos sempre, não quero o Férrez nunca na VEJA, quero o Férrez sempre na linha de frente, e jamais na ala dos contentes e felizes com a situação deplorável do Brasil. Fato Realista é sim manifesto, é sim verso violento, e que se foda o sistema. Abraços.

Turu curitiba disse...

E isso ai ferrez...mais e ai o que fazer? temos e mais é que salvar as crianças que são puras, o resto pode joga bomba que ta perdido; quem quê sabe que o moleque na quinta serie não sabe escreve , male -male lê alguma coisa a quem isso interessa, essa semana li que 70% dos alunos não recebe o estudo necessário Segundo algum orgão que não recordo o nome, mais e ai eu te pergunto que patria estamos formando; patria de telespectadores que não podem ( nem querem)questionar as informacões que recebe, informações quase sempre distorcidas... puta que paril, passa ano entra ano e nada muda, não da pra fica vendendo amor, apesar de ser apaixonado , romantico, mais não tipo aquele da globo, tipo aquele de cuba. aquele do afegânistão, aquele do onibus, aquele, aquele dai que é correria, e na humildade aquele daqui de curitiba... abraço fica com Deus.

Unknown disse...

PQP MUINTO CONTUNDENTE E FRANCO UM DIRETO NOS IPOCRITAS FIQUEI FASCINADO COM VC CONSEGUE FALAR TÃO PROFUNDAMENTE SOBRE O TEMA

EMOCIONANTE, VERIDICO E BRASILEIRO

Marcela Prado disse...

eu li voltei e estou amando. hehe.

Eduardo Machado Santinon disse...

Do caralho Ferrez, não muda não véio, com Deus aí.

fernando disse...

é isso ai ferréz, é isso que essa garotada ta precisando, de alguem que saiba falar a ligua deles, e que os trate como iguais,chega de esperança vazia,precisamos de algo mais concreto,mais concreto que uma borrachada ou um revolver na mão,é sempre paro pra penssar vejo uma galera que cresceu comigo seguindo caminhos completamente opostos uns que tinha de tudo que um pae e uma mão trabalhadores podiam dar, fome não passava nem frio tinah acessoa a escola,"Escola",ainda assim escolhendo um caminho sem futuro,ja outors que passavam muita nessecidade e perssistiram,po ta complicado a garotada ta sem conceito sem noção, mais ainda tem aqueles que te fazem ter esperança,uma esperança mais concreta,e caras como vc véio tem grande influencia nessa mudança,é isso ai cara força na caminhada..

historiador disse...

Isso aew man. Bem aventurado os que tem o dom de expressar o que não é percebido,ou por medo e conformismo, não é expressado!