Blog do escritor Ferréz

Polícia que Massacra.

A contagem de corpos continua, essa madrugada, 6 mortos, entre eles 2 moradores de rua, é fácil, eles deviam ser do PCC, estavam despistando morando na rua a tantos anos. A covardia vai sempre para os mais fracos, e quem pode falar não deve ficar em silêncio, cadê o amor a periferia? Nessa hora que somos mais úteis, mais nescessários, e temos que fazer nossa parte. Um jovem de 19 anos na Zona Sul, um carro preto disparando, o mesmo perfil, pistola 380, mais uma mãe que chora. Lá na zona Oeste um homem fechando o bar, o mesmo carro preto e três homens atirando. Alckimin em suas declarações deu o ponto de resposta da polícia, e quem paga é o povo, ou vocês francamente acham que tem algum grande criminoso na favela de Paraisópolis que foi ocupada e está sendo martirizada nesse momento? São 600 homens da Tropa de Choque da PM. O objetivo é asfixiar o tráfico de drogas e causar prejuízos ao Primeiro Comando da Capital (PCC). A ação na segunda maior favela de São Paulo deve durar pelo menos um mês. para de fato causar algum prejuízo tinha que ter a mesma quantidade de homens no Alto de Pinheiros, na Oscar Freire e na Vila Olympia. O que está acontecendo é que as execuções de policiasi são seguidas por ações de "grupo de extermínios" que saem atirando em bares, suspeitos, supostos criminosos ou qualquer um que pareça suspeito, tiver de boné e se for negro piorou, 6 pessoas foram mortas, ontem foram 8, todos periféricos, reféns da pobreza, mortos por estar na periferia. Seus rostos não são mostrados, suas histórias não são contadas, pois não morreram em área nobre, não tinham sonhos, nem futuro. A investigação vai seguir também da mesma forma, sem dar importância, colocando todo mundo no mesmo pacote. Os rostos ricos, brancos, bem nutridos dos jornalistas continuam repetindo a mesma morte de PM para comover a massa e legitimar a ação covarde do Governo.

Tentativas (Ferréz)

Tentativas
Música do Nazareth se mistura com o que tenho que escrever, noite de balada para uns, noite de balada de certa forma para outros. A rádio some e finalmente os pensamentos se soltam, disparam como a turnê de Clapton em 2001 vista num dvd pirata comprado no Jardim Comercial, numa barraca abarrotada de lançamentos e catálogos, todos devidamente separados por nomes e fichas internas, não foi lá que tive o prazer de adquirir Floyd, depois de tantos anos saiu em dvd o Pulse, e por mais alto que eu consigo deixar, o barulho do funk estremece e grita. Quem senta, senta, senta, senta se concentra. O Gol prata finalmente vira a rua e Al Pacino me encara da estante, ele pensa que com sua roupa branca e uma pistola na mão pode me intimidar, mal sabe ele onde está. O caderno de anotações está cheio, versos para letras de músicas, inícios de textos que nunca serão terminados, desabafos, trechos de pensamentos tumultuados, idéias que não serão realizadas e dicas de livros que nunca serão comprados, tudo ao lado de uma garrafa azul vazia a algumas horas. Kirby e Colin disputam traços em minha mente, mas é Paulo Sérgio que quer chamar atenção e um de seus discos caem em cima da única agulha Ortofon que tenho, ao lado tem outra garrafa azul, dessa vez é uma de café, a anterior era de água, a de café me foi dada pela mãe de um parceiro. Stan Lee não, ele não, por exemplo o Surfista, quem criou ele? e quem fez o Capitão América? Vamos ser sinceros, o que Lee fez ultimamente além de programas de televisão, sendo somente uma caricatura dele mesmo? É o mesmo que comparar Roberto Carlos com Amado Batista, um tem mídia, mas o povo tá mesmo com o Amado. O Peixe Peludo se levanta e assim como Rourke em O Lutador, ele sabe que não será fácil ficar vivo e que só a vida pode leva-lo a nocaute. Seus desgraçados, agente só para quando quiser, quer dizer, eu só paro quando quiser, eu acho. A madrugada vem chegando, o ar que entra pela janela agora é mais para uma brisa, fica mais frio, eu tiro a camisa para saber realmente que ainda posso sentir algo, sei como Saramago, que a felicidade é só algo inventado para suportarmos a vida, e sei também que as meninas que passam agora por esse asfalto logo abaixo, só querem um pouco de diversão, mesmo sem ser a solução, a madrugada ainda pode oferecer algo melhor do que o pequeno barraco, recheado de familiares com mais sonhos que realizações e metros quadrados, o maldito Gol cinza passa novamente e o que sai lá de dentro ainda estremece o sobrado. Piroca, piroca, piroca. A palavra é repetida sem parar, um som grave estremece a casa, penso se isso fosse um texto Kafkiano ou eu virava um piroca e deslizava mole pelas escadas até sair no portão e começar a esmagar pessoas na rua, ou uma piroca gigante entraria pelo teto e destruiria toda a casa, ainda bem que não é. Lixo toma espaço da rua, os pedestres que se fodam, quem dirige carro acha que não é pedestre, nunca foi e nunca será, tem nojo dessa raça. Carros toma toda a calçada enquanto uma senhora caminha pela rua, em meio a motos e seus motores disparando tiros imaginários, entre a viela e o muro branco do sítio um casal se aperta e prova que aquela coisa ainda pode estar no ar. Adolfo Aizen vem na minha cabeça, deve ter sido por ter a alguns dias lido o catálogo da Ebal, que Edição Maravilhosa, embora mais raro eu acho é Raio Vermelho, o primeiro lançamento da Abril, quando nem chamava editora Abril, outra revista em quadrinhos que procuro é Raimundo o Cangaceiro, pois José Lanzellotti além dos quadrinhos fez uma grande documentação histórica ao criar o personagem, mas talvez o motivo também seja pelo nome do personagem, mesmo nome do meu pai. A corrente de ar diminui, alguém chega e diz que minha filha está perguntando porque estou demorando, agora tiro os olhos do monitor e vejo minha esposa, embora suas palavras sejam ditas em nome da menina, sinto que são suas, vou ver a pequena na cama, paro de escrever o texto. Ela barganha para ir dormir com a mãe enquanto eu não chego, concordo, ninguém aguenta um sorriso misturado com sono, volto para meu cômodo entulhado de celulose, mergulho no texto, mas as vozes na rua me tiram do que tinha pensado em escrever, fogos de artificio tornam ainda mais estranha a madrugada, quem seria o maldito que as altas horas soltaria esses fogos, talvez seja algum jogo na televisão, embora não seja horário nobre, bem longe disso, ou mesmo um balão, como os fogos continuam vou até a janela e não vejo balão nenhum, queria ser Tintin e chegar em algum lugar antes de todos, assim como ele chegou na lua em 1950, tantos anos antes de Neil Armstrong, mas mesmo assim é Armstrong que recebe flores em sua estátua. O jornalista na televisão diz que a culpa é das pessoas que agora podem ter carro, não é simples assim, a culpa é você poder ter e não saber usar, pra que tanto som? Equipar carro com som na quebrada virou moda, mas quem vai aguentar viver com tanto barulho? Enquanto educação e cultura não forem prioridade o dinheiro só vai servir para transformar a favela num inferno, onde se compra um guarda-roupa novo e o velho se joga na rua, onde o sofá usado agora está dentro do córrego, consumir sem conhecimento, é empinar moto, usar farinha demais, tomar whisky com energético, Catuaba com Schweppes, parar em todo posto para abastecer o carro e abastecer o corpo com cerveja (porque postos de gasolina vendem cerveja, se a idéia e não dirigir depois de beber?). O dinheiro adquirido, o poder aquisitivo tão esperado, com 3 governos de esquerda, deveriam ser usados para todos se melhorarem como seres humanos, aprender, estudar, saber o grande potencial da cultura, adquirir senso critico, e isso tudo banhando com diversão também, uma boa peça de teatro, um show ao vivo, uma exposição de quadros, nada como ver uma obra ao vivo, bons livros, fotografar ou ir a exposições de fotografia, boas revistas em quadrinhos, as possibilidades são ilimitadas, e se tudo isso estiver longe, vá a algum sarau, são vários na quebrada graças a militância de alguns, mas para isso precisamos começar imediatamente a pregar algo além do consumismo suicida. Ouço a música ao longe novamente, e abaixo meu velho receiver para entender a letra, impossível, mas indo a janela vejo o maldito Gol cinza e tudo estremece. Uma buzina é pressionada por vários minutos sem parar, parece de uma bicicleta, o menino já treina para no futuro gerar barulho, meus dedos não conseguem digitar, o coração está mais rápido, tento olhar um pouco para a TV, ela sempre me deixa mais na moral, agora ouço um disparo, já não parece mais fogos, então vou fechar a janela, Rex Mundi livro dois está a minha espera, o primeiro Guardião do templo foi uma grande diversão, não tanta como Os Beats, uma graphic novel coletiva com roteiros de Pekar, Peters e um monte de gente bacana, são trabalhos que me tiram daqui por algumas horas, morar no tema é foda demais, para pegar distância tenho que ir dos livros clássicos até os fanzines que saíram essa semana. Logo abaixo de Os Beats está Grendel de Matt Wagner, uma edição que oscila entre lirismo e algumas histórias já batidas, o que menos interessa do apanhado é o personagem principal, e isso remete muito a Spirit de Eisner, mas não é Um contrato com Deus que interessa, dá para ver 100 balas e quem lê algo de Azzarello sabe o que digo, nem os Escapistas conseguiriam parar de virar as páginas, agora que meus dedos estão travando e minha mente tenta não ouvir Queem de novo na rádio, Aberrações no coração da América ou Sinal e ruído de Gaiman e Mckean vão terminar minha noite, embora eu não me encaixe nas pessoas que sobem a montanha para esperar a virada do século, porque na verdade estou mais para o escritor que não quer fazer os exames. O clima de Sinal e ruído é perfeito para se pensar a vida através da ameaça de perde-la. O resto de Pizza ainda está em cima do sofá na sala, e como tive que andar muito para comprar, porque nessa rua não tem uma pizzaria, e na rua de cima, as madeiras usadas no forno são restos de móveis, então como sou um pouco informado para comer algo misturado com produtos químicos vindos da fumaça, e aqui não tem sequer ou uma padaria, tive que andar muito mesmo para trazer essa pizza. Em alguns lugares é tão comum, porque aqui não? e olha que não estou exigindo nada demais, comida japonesa? Frango Frito? não, só uma maldita pizzaria. Paro o texto, por aqui já chega de escrever, vou até a cozinha, ponho água para esquentar, não consigo comer pizza com refrigerante, meu negócio é café com leite, volto para a sala mas antes que eu me encaixe no sofá e comece a foliar os desenhos de Mckean, a casa estremece e sei que é o maldito Gol cinca novamente. - Quem senta, senta, senta, senta se concentra. Ferréz é datilógrafo. E assina todos os meses a coluna Litera-rua na revista Fórum.

A guerra convarde em São Paulo

Salve, A guerra que não é oficializada continua em São Paulo, e quem paga o preço é a população, como escritor fiz uma crônica curta e tá no site. www.revistaforum.com.br com fotos do Marcus Kawada que também é daqui da Sul. Todos temos que se mobilizar para não deixar virar rotina a morte de pessoas inocentes nas quebradas, várias pessoas estão agindo, para não sermos coniventes com essa covardia. Lembre-se você morador de favela ou periferia também pode ser a próxima vítima. Convocação geral para não aceitar isso, essa guerra não é nossa, não queremos ela.

Ultimas camisas Dexter

As camisas do Dexter feitas pela 1DASUL, estão acabando, restaram poucas unidades na loja do Centro, 24 de Maio. Como tem muitos pedidos via face, quem quiser corre lá, pois o Dexter também começou a vendar em shows e ai que o bicho pegou. É muito bom fazer uma parceria dessas com quem realmente batalha também, é a Oitavo Anjo e 1DASUL fortalecendo o Rap Nacional.

Saudade do início

Salve Tem horas que dá uma saudade, montei a 1DASUL em 1999, inaugurei a loja no mesmo ano, no Jardim Comercial Capão Redondo, de lá pra cá foi tanto trampo, ontem recebi as fotos e o cartão da loja de Santana do Parnaíba, comandada pelo Mano Tuím, muito orgulho de ver que a Marca tá chegando tão longe, sem nunca NUNCA ter vendido uma roupa chinesa na vida, a marca feita com mão de obra da quebrada, que hoje além de estar na 24 de Maio Centro, está em mais 6 estados, e 15 cidades.
Esse é o protótipo do desenho do anjo, Feito pelo Mike e pelo South, e com ele fomos cativando mano a mano, mina a mina e provando que podíamos fazer do nosso jeito, comandar nossa cultura de dentro do gueto.
Esse foi o primeiro boné, bordado em 1999 no supermercado Sé, hoje shopping Campo Limpo, fiz 7 bonés, ia vendando pros parceiros, queria ver o nome do meu primeiro livro, que ainda era um rascunho, na cabeça dos manos. 1DASUl, vários momentos, muita história, mas principalmente o orgulho de ter feito algo que deu orgulho pro bairro, que mexeu com a auto estima do nosso povo. Hoje gera empregos pros mesmos manos que a usam, e gera orgulho pro bairro que tem sua marca, sua identidade garantida, em cada mano ou mina que sua nossas roupas, que lê nossos livros, que participa dos shows, palestras. A família só cresce, seja bem vinda Santana do Parnaíba, e que cada lugar que o símbolo estiver, as marcas da elite sejam enfraquecidas. Ninguém controla mais nossa cultura. Ferréz

A Interferência no dia das crianças

Ajudar o próximo causa alegria extrema.
Vendo a máquina de algodão lembre do Pote mágico.
Catia pintando as crianças.
Cebola ajudando, todo mundo fez um pouquinho pra fortalecer.
Elaine pintando as crianças.
Distribuição dos brinquedos, muito da hora.
Bom, alguém tem que limpar a bangunça. Agradecemos a todos envolvidos nessa linda festa, que fez o dia das crianças da Viela Santiago ser real, o Interferência continua firme e forte na missão.
Acompanhe agente no www.onginterferencia.blogspot.com

Mídia só mostra morte de polícia enquanto população é exterminada

Mais um exemplo da matança que a periferia tá enfrentando enquanto a mídia só fica falando das mortes dos policias. Luto: Rapper Daniel Gabu do Rosana é assassinado Postado por Paula Farias em 14 de outubro de 2012
A onda de violência que está assolando as periferias de São Paulo, deixou mais uma vitima fatal neste domingo (14) o rapper Daniel Gabu do Rosana, de apenas 22 anos, foi brutalmente assassinado por policiais, na região do Campo Limpo, extremo sul da capital. O rapper Gabu ficou conhecido nacionalmente através da Mixtape “O Jogo É Hoje”, cantando a música “Salve Favelado”, em parceria com o Du Bronks. O disco que foi produzido pela Nike e teve ainda as participações de Don Pixote, Ice Blue, Terra Preta entre outros. Um mais jovem rapper, que tinha uma vida inteira pela frente, teve a carreira interrompida de forma brutal, e agora engrossa as tristes estatísticas da violência no Brasil. A família do RAP NACIONAL está de luto, diversas mensagens de indignação estão sendo vinculadas nas redes sociais. Espera-se que a justiça, dessa vez seja feita, que os culpados sejam presos, que esse crime não fique impune como tantos outros.

Quadrinhos

Salve, as coisas andam a milhão, fui no lançamento do meu grande ídolo Rodolfo Zalla, e foi uma noite muito legal, ao lado do Baraldi agente tirou essa foto bacana, lá também encontrei o grande editor e desenhista Franco de Rosa, um dos nomes mais importantes dos quadrinhos nacionais, em breve vou postar uma novidade sobre nossa futura parceria, e o que vai sair agora em novembro, é Desterro, HQ feita por mim e De Maio, que já fez parceria comigo em Os inimigos não mandam flores - lançado pela Pixel.
Periferia com responsabilidade e conteúdo, Desterro promete chacoalhar o mercado de HQ Nacional, veja o traço de Alexandre de Maio, a HQ sai em novembro nas livrarias.

Ferréz: 15 anos de literatura e resistência - Eleilson Leite

Ferréz:15 Anos de Literatura e Resistência Criativo em vários gêneros e empreendedor pela cultura periférica, Ferréz prepara romance surpreendente, que confirmará sua condição de grande escritor Por Antonio Eleilson Leite, na coluna Literatura Periférica No editorial da edição de maio da Agenda Cultural da Periferia, publicação da ONG Ação Educativa, estão enumeradas vinte efemérides relacionadas com o ano de 2007 e que foram importantes para a cultura na periferia . Começa com a própria Agenda, lançada naquele ano e os vinte anos da Rádio Heliópolis FM que há cinco passou a ter vida legal como rádio comunitária. Dentre os outros dezoito marcos do ano de 2007 mencionados texto, tem o surgimento da Coleção Literatura Periférica na Global Editora, a Coleção Pelas Periferias do Brasil e a loja Suburbano Convicto, ambas iniciativas de Alessandro Buzo, os dez anos do CD Sobrevivendo no Inferno, do Racionais MC’s , entre outros acontecimentos. De fato, é algo notável. Talvez 2007 tenha sido realmente um divisor de águas. Porém, toda lista, por mais ampla que seja, é sempre restritiva e sujeita a omissões. Esta justa homenagem da Ação Educativa não se livrou desse risco. Faltou pelo menos uma efeméride muito importante. Naquele ano de 2007, o escritor Ferréz comemorava dez anos de carreira literária. Em 1997, ele publicou seu primeiro livro, uma obra de poesia chamada Fortaleza da Desilusão. Ou seja, neste ano de 2012, Ferréz faz 15 anos de intensa atividade literária. Reginaldo Ferreira da Silva tinha 22 anos quando, de tanto ler livros, resolveu fazer um para chamar de seu. Falemos então deste escritor, músico, poeta e empreendedor de 36 anos. E para abordar a trajetória do escritor, ativista e empreendedor Ferréz, assisti novamente o documentário Literatura e Resistência. Dirigido por ele mesmo e lançado em 2009, este DVD conta sua história com o auxilio luxuoso de amigos de quebrada, cultivados desde a infância, e de parceiros conquistados a partir de sua notoriedade como escritor — gente ilustre como Chico Cesar, Marcelino Freire, Paulo Lins, Lourenço Mutarelli, entre outros. Vídeo feito na raça, com muita imagem registrada com equipamento doméstico, fragmentos de programas de TV, mas também vários registros bem produzidos. O resultado é uma compilação iconográfica da trajetória deste que, como diz Chico Cesar logo na abertura, é um dos principais escritores brasileiros da atualidade. O título do vídeo faz jus ao que é exposto na obra. Veja: não é literatura de resistência, é Literatura e Resistência. A palavra resistência, tão desgastada quando pronunciada na voz de militantes que só sabem ficar na defensiva, ganha conotação libertária ao expressar a determinação com que Ferréz realizou seus projetos. Tudo conspirava contra o cara, mas ele não só contrariou as estatísticas, como inverteu a lógica do destino. Por isso, a definição que mais se ouve nas falas dos entrevistados ao se referirem a ele é “herói”. Mas tudo que ele não quer é ser um herói. Embora sendo um fanático leitor de quadrinhos, a figura de um notável entre os comuns, que tem a missão de salvação, não lhe cai bem. Ele é 1 Da Sul . O nome de sua grife e loja quer dizer união: “somos todos um pela dignidade da Zona Sul”. Ferréz era visto na quebrada como aquele sujeito esquisito. Não bebia, não fumava, não gostava de futebol (até hoje ele é assim ). Só queria saber de ler, por isso era isolado. Mas não parava de pensar na sua comunidade, o Jardim Comercial, um bairro no imenso distrito do Capão Redondo, território periférico onde moram mais de 200 mil habitantes. Sempre trabalhou, desde cedo teve que ajudar a mãe nos cuidados com os irmãos. Nunca exerceu qualquer função que exigisse alta qulificação. Foi assistente de pedreiro, balconista de padaria, faxineiro, auxiliar de escritório, entre outras ocupações. Mas sua vasta experiência de serviços gerais lhe deu um senso prático e conhecimentos tão diversificados que costumava impressionar seus amigos que o identificavam como um “sabe-tudo”. Provavelmente a impressão que se tinha de Ferréz na quebrada era um peão metido a intelectual. Mas ele não era arrogante. Aliás, muito humilde. Há uma passagem marcante no vídeo que mostra bem isso . Ao publicar seu livro Fortaleza da Desilusão, proeza alcançada graças a um inusitado apoio de sua então patroa, apreciadora de poesias, Ferréz fez contato com uma distribuidora de livros, pois não sabia o que fazer com quase mil exemplares da obra. O livreiro pediu dez exemplares do livro e ele, com ajuda de um amigo perueiro, levou todo o estoque para a distribuidora que ficava no Brás. Insensível, o distribuidor não quis sequer armazenar os livros em seu estoque, ficando apenas com a dezena de exemplares combinada. Desiludido, Ferréz sentou-se sobre os pacotes do Fortaleza da Desilusão. Meio que esperando um milagre, ali ficou até o anoitecer, protegendo os livros do assédio dos catadores de papelão que rondavam o local, ávidos pelo lote que devia pesar cerca de 300 quilos. A solidariedade enfim chegou. O dono do bar vizinho à distribuidora abordou o jovem poeta, oferecendo seu modesto estabelecimento para guardar os pacotes. Ferréz ficou mais de uma semana buscando diariamente uma cota de livros que coubesse em sua mochila, até transportar todos os exemplares de volta para casa. Era para desistir. Mas ele, humildemente, resistiu. Ferréz abandonou sua veia poética, pelo menos o estilo de seu frustrado livro de estreia, que flertava com a poesia concreta. Criou outras rimas depois, como compositor e cantor de rap. Muitas delas estão na trilha sonora do DVD e nos clipes dos extras. Vale a pena conferir, especialmente o clipe da música Judas, que tem um sampler da canção Child in Time do Deep Purple, algo improvável para um rap. Mas sua incursão como MC é algo que surge com força somente depois do sucesso como escritor. Voltando ao fatídico final de século XX, ele se meteu a produzir roupas e acessórios. Surgiu em 1999 a 1Da Sul. Assim como não era poeta e se propôs a fazer poesia, ele também de roupa não entendia, mas criou uma grife. Cumpriu na prática o que diz a canção dos Titãs: “eu não sei fazer música, mas eu faço; eu não sei cantar as músicas que faço, mas eu canto”. Sua empresa surgiu de uma brincadeira, conta ele com muita graça no vídeo. No dia primeiro de abril, soltou uma mentira de que surgira uma grife na quebrada com o nome 1 Da Sul; que fazia roupas e coisa e tal; que estava bombando na quebrada. Os manos não deram atenção ao devaneio do poeta, mas Reginaldo insistiu na anedota e de tanto brincar com o feitiço, se fez de feiticeiro. Coisa de maluco mesmo. Levaria páginas para descrever algumas das agruras do início de seu negócio. Veja o documentário e depois vá à Avenida Comendador Santana, no Centro do Capão e confira a loja bacana que é. Se não quiser ir á perifa, tem uma filial na galeria da rua 24 de Maio no Centro. O empreendedor, portanto, surgiu antes do escritor. E talvez se não fosse empreendedor não teria sido escritor, ou pelo menos não teria persistido (resistido) até se tornar escritor. Um ano depois de criada a 1Da Sul, Ferréz lançou o romance Capão Pecado. Publicado pela extinta editora Labortexto, o livro ganhou notabilidade impulsionado pela atuação de Ferréz como colunista na revista Caros Amigos. Contribuiu também para seu reconhecimento a inserção do autor na militância política. A esquerda vivia a conquista de Lula nas eleições de 2002, numa conjuntura marcada pelo advento do Fórum Social Mundial, que teve sua primeira edição em 2001 se tornou espaço de convergência dos que acreditavam que outro mundo era possível. Era, enfim, um contexto oportuno para uma inciativa como esta. Uma voz da periferia ganha as páginas de um livro. Mas nada disso adiantaria se não fosse uma grande obra. Um romance bem estruturado, que já respira a benéfica influência do livro Cidade de Deus, de Paulo Lins, grande sucesso editorial adaptado para o cinema pelas lentes de Fernando Meirelles. Se não tivesse méritos literários, portanto estéticos, Capão Pecado não teria vendido cerca de 100 mil exemplares e se mantido com vigor e presença na literatura atual, doze anos depois. Quer saber mais dessa e de outras histórias, além de ver o DVD, leia o livro da Erica Peçanha: Vozes Marginais na Literatura.[1] O jovem esclarecido da periferia, poeta frustrado porém não derrotado, virou empreendedor, escritor e ativista cultural radical e lúcido. Antes de publicar seu segundo livro, Manual Prático do Ódio, em 2003, Ferréz produziu, pela Caros Amigos, três suplementos intitulados Literatura Marginal. Lançou dezenas de poetas e escritores de periferias de todo o Brasil. Sua grife se expande. Passa a ser reconhecido como escritor de prestígio com seu segundo romance. É traduzido em países como Espanha, Itália, México e Alemanha. Excursiona no exterior, participa de inúmeros eventos literários: enfim, torna-se uma notoriedade. Mas ele ainda resiste. Aquela angústia que o consumiu sentado sobre os pacotes de livros na calçada do Brás passou a ser uma história a ser lembrada como fábula. O distribuidor que o subestimou, para não dizer outra coisa, certamente vendeu muito livro do Ferréz. No prefácio da primeira edição do Capão Pecado, quando o livro passou a ser publicado pela Editora Objetiva, em 2005, ele conta que, depois do sucesso do livro, foi fazer palestra no hotel que o havia rejeitado como faxineiro. Faculdades e escolas frequentadas pela burguesia convidavam-no para palestrar. Numas dessas, mostra o vídeo, ele desafia os jovens de bochecha rosada a procurar um negro nas inúmeras fotos de alunos expostas em um enorme bâner que servia de fundo para o auditório onde a conversa se dava. Ele gostava de causar constrangimentos ao sistema. Em 2004, Ferréz perdeu um grande amigo, Preto Ghóez, líder do grupo Clã Nordestino, morto em um acidente de carro. Maranhense, comunista radical, Preto Ghóez surge no DVD numa rara imagem para deixar sua mensagem em forma de bordão: “todo ódio à burguesia é pouco”. Ferréz sempre zelou pelo legado de Ghóez e a aparição deste no vídeo confere ao documentário ainda mais valor. Ghoéz publicou poemas nos suplementos de Caros Amigos. Dois deles saíram na coletânea Literatura Marginal – Talentos da escrita Periférica, que Ferrez publicou na Editora Agir em 2005, em mais uma inciativa promovendo a literatura da periferia, agora numa grande editora comercial. O ano de 2006 é dramático para a periferia e toda a cidade de São Paulo. Em maio, acontecem os ataques atribuídos ao PCC, que deflagram uma violenta reação da Polícia Militar. Tempos de pânico, medo e desilusão. Ferréz se vê perseguido. Refugia-se na casa de Paulo Lins, longe da capital paulista. Naquele mesmo ano, publica seu terceiro livro, com o sugestivo nome de Ninguém é Inocente em São Paulo, sua estreia como escritor de contos. Passada a tormenta, veio um tempo de discrição. Ferréz, creio, passa a refletir mais sobre sua obra e condição de escritor. Muita gente que ele publicou passou a produzir seus próprios livros. Ele se volta mais a sua carreira. Chega então o histórico ano de 2007; dez anos de Fortaleza da Desilusão. Ferréz publica um livro infantil: Amanhecer Esmeralda, mais um sucesso. Isso, curiosamente não é abordado no vídeo. Parece-me algo tão significativo na carreira dele, deveria estar lá. Mas naquele ano, Ferréz participa de um projeto ao qual se refere com muito orgulho. Trata-se da coletânea Cenas da Favela – As melhores histórias da periferia brasileira, organizada pelo escritor Nelson de Oliveira e publicada pela Editora Geração Editorial (que assim como a Agir, faz parte do grupo Ediouro). Nesta obra, Ferréz aparece ao lado de Carlos Drummond de Andrade, Rubem Fonseca. Lygia Fagundes Telles, Paulo Lins e outros grandes nomes da literatura brasileira. Mais um livro que o distribuidor do Brás vendeu muito. Ferréz chegava à maturidade com pouco mais de 30 anos. Ele dá sinais evidentes de preocupações estéticas. No vídeo discorre longamente sobre suas principais influências. Como escritor experimentado, caracteriza cada um dos autores que lhe são caros: Hermann Hesse, Lima Barreto, Plinio Marcos e João Antonio. Retira livro a livro das prateleiras de sua vasta biblioteca, comentando um por um com a autoridade de um escritor consciente do valor de sua obra e do tributo que paga à linhagem de escritores que o formaram. O professor Antonio Cândido, na sua clássica obra Literatura e Sociedade nos ensina sobre a relação do autor com o grupo social do qual faz parte. Didaticamente, como lhe é característico, Cândido enumera os pontos dessa relação. Primeiro, a necessidade de um agente individual tomar para si a tarefa de criar uma obra. Em seguida, vem o reconhecimento (ou não) como criador, pela sociedade. Por fim, o autor usa a obra (marcada pela sociedade) como “veículo de suas aspirações individuais mais profundas”[2]. Ferréz parece cumprir na prática, a teoria de Antonio Cândido. Mas falta, a este grande escritor da periferia, o devido reconhecimento do meio acadêmico: por seus méritos literários e não só por sua atuação e condição social como é comum nos estudos que lhe têm como objeto. Em 2012, Ferrez lançará mais um livro. Será outro romance. O nome da obra é Deus foi almoçar. Ele andou fazendo leitura do livro em alguns saraus e há trechos no blog do escritor (www.ferrez.blogspot.com). Muita gente vai se surpreender com o estilo e a trama. Ele se desvincula um pouco da escrita e, principalmente, da temática que o consagrou. Não. Ferréz não está abandonando suas origens. Mas creio que ele está explorando uma nova concepção estética e isso é muito bom. Antonio Candido explica, na mesma obra citada anteriormente, que embora o texto sempre esteja imbricada com o meio social, os “impulsos pessoais predominam na verdadeira obra de arte sobre quaisquer elementos sociais a que se combinem”[3]. Portanto, Ferréz, aventure-se por novas formas. Afinal, na arte, forma é conteúdo. Explore ao máximo seu talento e parabéns pelos 15 anos de literatura e resistência. - 1 Dissertação de mestrado da autora, publicado pela Editora Aeroplano na Coleção Tramas Urbanas, Rio de Janeiro, 2009 2 Mello e Souza, Antonio Candido, Literatura e Sociedade, capítulo “A literatura e a vida social”, pag. 23, Publifolha, São Paulo, 2000. 3 Ibid, pag. 33 –
Antonio Eleilson Leite é historiador, programador cultural e coordenador do Programa de Cultura da ONG Ação Educativa

Sobre o sorriso dos políticos (ferréz)

Sobre o sorriso dos políticos. Tem um monte de gente, um monte mesmo, me perguntando sobre o meu posicionamento na política, pocha! Meu posicionamente é como o de todo mundo, vítima. Faz um tempo que não me identifico com nenhum partido, a coisa parou de ser que nem time, tá todo mundo no mesmo saco, literalmente. Ver cartazes colados em barracos, em prédios abandonados, em bares que acham que vão ganhar a visita do candidato. Até num pequeno barraco improvisado no canto do córrego da Av. Carlos Lacerda tem um cartaz do candidato sorrindo, sorrindo da cara da gente, debochando, me irritando, dá vontade de calar sua boca, de ferrar com seu sorriso. Esses dias eu chutei seu rosto, machuquei sua orelha, cuspi no seu nariz, mas olhei em volta e vi vários dele, e continuavam sorrindo, e não calavam a boca. Essa campanha para vereador foi uma das mais nojentas que já vi aqui no Capão Redondo, não sei em outras quebradas, mas aqui vale tudo, dar saco de arroz, asfaltar, colocar iluminação, até dono de açougue candidato dando carne em comício. E vai tentar falar que isso é errado, tentar argumentar que não devia ser assim. - Se tá loco? nunca chega nada e quando chega você quer melar tudo, deixa o cara pô, o cara tá ai conóiz. Parece que estamos numa realidade alternativa, onde todo mundo tá agindo estranho. Apoiar alguém fugiu de toda lógica, virou um ponto de vista mercadológico, pura e simplesmente. Artistas já fazem isso em outro grau, mas ver assim na rua, em todo mundo, em amigos, fazendo só por bico, mas não entendendo que fortificamos sempre o inimigo. Tem gente que apoia um prefeito com medo do outro ganhar, é o famoso menos ruim, eu não quero votar assim, não quero ter que votar no menos ruim. Sempre fui muito militante, difendi muitas vezes tal pessoa, porque de fato acreditava, mas desde a última eleição meu voto tem sido como meu sentimento, branco. Ou talvez como sinto que vai ser o resultado para a perifa a coisa tende a ter resultado nulo. Parava os muleques na rua, falava da mudança, de acreditar, hoje fico vendo os cartazes imensos, os rostos sorrindo, os números cortados com estiletes por outro partido, as bandeiras sendo balançadas com desgosto, por 30, 40 reais por dia. Vejo o churrasco, a bebida, a palma forçada, os gritos combinados, vejo tudo isso menos a militância que eu via antes, verdadeira, honrada, com fé de verdade. Depois que o meu partido trocou uma candidata que eu sempre admirei por alguns minutos de horário a mais na TV, isso enterrou qualquer vontade de participar. Trair o que agente acredita, o que agente tanto prega de escola em escola, palestra em palestra, texto em texto, trocar tudo pelo menos ruim. Eles dizem - esse cara se ganhar vai foder a periferia. Tio, todo mundo sempre fode a periferia, ela vai estar sempre no risco, sempre a mercê, porque é onde você pode por seu jogo sujo para funcionar. Vítima de filmagens, estudantes interessados em suas teses, fotógrafos turistas que retratam o caos e vão embora expor em outro lugar, teólogos, falsos embaixadores, toda raça de oportunista. E por fim a política, um sorriso mais forçado do que outro, histórias de que tal candidato é do crime, que o outro fecha com a polícia, que o outro matou num sei quem, e vamos seguindo no policia-ladrão, brincando de nação. Opção é difícil, separar o joil do lixo, ou do trigo, quando se dá tanto pão por sua força na missão. Eleger, acreditar, nunca foram palavras tão diferentes. Fico com o movimento das ruas, com os pixos nas paredes, não vou contribuir para sustentar vagabundo. Vou ouvir - mas logo você, um cara tão politizado? Desculpa ai a decepção, mas já algum tempo vendo roupa todo dia para não ter que pagar veneno na minha opinião, para não me lapidar ao interesse que gera vantagens. Você já se perguntou, se fez complô, se já participou de coisas que teve nojo, se já fez por interesse e depois teve vontade de vomitar? Se já aceitou, pactuou, participou e depois se pergountou quando olhou para o espelho. - Essa porra é o que sou agora? Eu já, e não gostei da resposta. Pelos outros já fiz coisas que não faria por mim, e nesses casos não recebi sequer um obrigado. Agora de uns tempos pra cá, tenho sido sincero, pelo menos comigo mesmo, pela minha filha , meus amigos. Eu não vou digitar número pelo menos ruim. Ferréz

Ferréz é o novo colunista da Revista Fórum

Salve Rapa, a partir desse mês estou de casa nova, sou o novo colunista da Revista Fórum, que está em todas as bancas mensalmente. A muito tempo acompanho a caminhada da revista, e foi um orgulho engrossar o time que já tem Alexandre de Maio e Carlos Minuano. A primeira coluna que escrevi fala sobre a minha passagem pelo hospital, e os horrores que hoje enfrentamos para tentar a "cura". Vou ler esse novo texto pela primeira vez na tradicional festa do Guacurí, segue o convite abaixo. O nome da coluna na revista vai ser LiteraRua, o mesmo nome de um texto que fiz a muitos anos na revista Caros Amigos e que sempre levei por ai nas palestras e shows. É isso, Literatura e atitude, feita dentro da quebrada, diretamente do Capão pro Brasil.

O Oitavo Anjo na 1dasul

O novo lançamento da 1DASUL Camisa DEXTER - Desenho de Alexandre de Maio, Confeccionada pela 1DASUL no Bairro Vale das VirtudeS. Da criação passando pela costura, até a venda: a Periferia no comando da sua cultura. Quantidade Limitada.