Como se acabar com uma favela? pelas beiradas...
Como Resistir? usando o que temos, a palavra.
Salve
Só um dia de resistência, vale mais que uma vida muda. Foi o que me veio a cabeça quando subi as vielas indo para Paraisópolis, dessa vez não para um rolê, ou palestra nem para fazer um show, como tantos que já fiz no Colombo ou nas quebras em torno, mas para lutar pela dignidade do povo que vem sendo acuado tanto pelo Choque quanto pelo trator.
Na nossa chegada, não se passou nem dois minutos e o vai e vem das viaturas do Choque é impressionante, não vimos ronda de policia normal, somente o Choque batendo geral em cada esquina, encarando todo mundo, plantando o que sabem, o terror em forma de autoridade.
A presença do estado é essa naquela favela.
mais pra frente alguém vai comentar, que o tráfico lá é forte, que tem que ter isso mesmo, mas agente sabe que o tráfico não é o alvo dessa algazarra toda, e que repressão nunca foi solução pra poblema nenhum, ainda mais revistando tiozinho que chega do trampo com a marmita vazia.
As autoridades sabem onde fica o tráfico, sabem como ele trabalha, lucram com ele também, fazem parte desse caldo criminoso.
Agora o povo é ameaça, ainda mais perto do Morumbi, ainda mais lado a lado com um metro quadrado caro como aquele.
Não estão "higienizando" Paraisópolis, estão destruindo arbitrariamente casas, estão dando uma mizéria que não dá nem para pagar 8 meses de aluguel por uma casa que o cara trabalhou uma vida para ter.
Não estão se preocupando com a população, nunca foi assim e nem é hoje que vai ser.
Me deixou com lágrimas nos olhos, os tratores em cima dos barracos, a lama por todo lugar, a tentativa de deixar claro que estavam "arrumando" a favela, casas destruídas, muitas pelas metades, rivalizando com igrejas cheias e bares mais ainda.
Fomos para o encontro, que estava com menos gente que a partida de futebol logo ao lado, mas só por um menino daqueles que estava lá atento, tentando entender o que era aquelas faixas e todo aquele povo falando de resistência já valeria a pena com certeza.
O Marc Bechar, que é roteirista da série 9MM colou comigo, deixando no ar uma pergunta que eu me fiz, porque não consegui convencer ninguém da minha quebrada a ir comigo, e pior ainda, o que ouvi foi que eu não deveria ir, que eu tinha o que perder, que não entendiam porque eu me metia nessas coisas, se já tinha meu carro, minha casa.
Não sabem que eu estou indo lá, mas não é só por eles, é por mim também, é pelo que já falei, pelo que já passei, pelo passado que já tive, pelo trator parecido com aquele de paraisópolis que já derrubou vizinho meu aqui no Capão, que já amedrontou um menino de 8 anos, que teve que sair de madrugada do barraco e que viu seu pai gritando para não fazerem aquilo, o mesmo pai que acordava quatro da manhã e só chegava em casa de noite, e mesmo assim, não consegui morar num lugar que não fosse "invadido".
Eu fui em Paraisópolis, assim como tantas outras quebradas, porque ninguém vai, porque não interessa pro artista que vai lá no dia da eleição, ajudar o politico a enganar aquele mesmo povo.
porque ninguém tá nem ai pra essa gente.
foi com orgulho que vi o Serginho Poeta e sua companheira, os manos do Força Ativa, que cantaram como o grupo Fantasma Vermelho, que vieram de Cidade Tiradentes, Lado Leste.
e o Plínio de Arruda Sampaio, que foi a única autoridade que veio. o resto dos convidados não presentes? bom! ficaram com medo, mas um dia o problema não vai mais esperar por eles, um dia o problema bate na porta deles não para chamar para ir, mas sim para obrigar a sair.
Os protestos continuam, enquanto os moradores forem oprimidos, como a viela Passarinho, que foi toda destruida.
e o mais impressionante, é que grande parte da população, só olha, observa os tratores derrubarem os vizinhos, e eu me lembro do Gueto de Varsóvia, lembro do filme "O Pianista".
O pianista polonês Wladyslaw Szpilman (Adrien Brody) interpretava peças clássicas em uma rádio de Varsóvia quando as primeiras bombas caíram sobre a cidade, em 1939. Com a invasão alemã e o início da 2ª Guerra Mundial, começaram também restrições aos judeus poloneses pelos nazistas. Inspirado nas memórias do pianista, o filme mostra o surgimento do Gueto de Varsóvia, quando os alemães construíram muros para encerrar os judeus em algumas áreas, e acompanha a perseguição que levou à captura e envio da família de Szpilman para os campos de concentração. Wladyslaw é o único que consegue fugir e é obrigado a se refugiar em prédios abandonados espalhados pela cidade, até que o pesadelo da guerra acabe.
Esse filme é o espelho dos nossos dias em Paraisópolis.
Ferréz
Em meio ao protesto, hora de sorrir, com um show de sapateado.
Deixo essa foto por última, os moradores, será que não merecem serem tratados como gente? construiram os prédios que estão ali próximos, limpam as casas, levam os filhos da elite para os colégios, educam eles, fazem sua comida, sua segurança.
No final, não tem segurança, não tem boa educação, não conseguem se alimentar, não tem tempo para ver os filhos e agora nem podem ter mais um teto.
Mas enquanti tiver vida, tem esperança, esse é o ditado, e ver manos e minas vindo de Cidade Tiradentes, da Zona Norte, do Capão e de várias outras quebradas para auxiliar Paraisópolis é mais do que eu podia um dia querer, somos poucos, mas SOMOS Resistência.